O signo da cúspide
O signo localizado na cúspide da Casa caracteriza os assuntos dessa Casa. Através da natureza desse signo - polaridade, elemento, modo, etc. - podemos avaliar os comportamentos e o tipo de ação que caracterizam a expressão da Casa.
Mesmo que exista outro signo com maior número de graus a ocupar a Casa, a caracterização principal é sempre conferida pelo signo que se localiza na cúspide. Repetimos: não importa se ocupa mais ou menos graus que outro signo, porque não estamos avaliando as “quantidades de signo”, mas sim as qualidades da cúspide.
O regente da Casa
O signo na cúspide determina também um outro fator fundamental da interpretação: o regente da Casa. Este é o planeta regente do signo que se encontra na cúspide. É denominado o regente ou senhor da Casa.
Se, por exemplo, a Casa X de um horóscopo tiver a sua cúspide a 22° de Touro, Vénus, o planeta regente desse signo, será o regente da Casa X (este é o caso do mapa de Agatha Christie).
Como é óbvio, o planeta regente nem sempre está localizado na Casa que rege; muitas vezes está noutra Casa e noutro signo. O posicionamento do planeta regente no mapa indica onde e como se vão realizar os temas significados pela Casa; a área de vida (onde) é-nos indicada pela Casa, e o modo de ação (como) pelo signo onde o planeta regente se encontra posicionado.
No exemplo de Agatha Christie, temos Vênus, regente da Casa X, posicionada na III, em Escorpião. Assim, os assuntos da Casa X (carreira) serão direcionados para as áreas da escrita e da comunicação (Casa III), de uma forma concentrada e tenaz (Escorpião, signo fixo).
Vemos assim que o planeta regente de uma Casa torna-se o significador específico dos assuntos dessa Casa. No caso de Agatha Christie, Vênus é o significador específico de profissão (porque rege a Casa X).
Natividade de Agatha Christie |
Vejamos agora o mapa de Florbela Espanca. A cúspide da Casa II está a 17" de Escorpião; Marte, o regente, está posicionado em Áries na Casa VII. Neste caso, Marte é o significador específico de recursos. Esta configuração indica que muitos dos recursos (Casa II) da escritora estão ligados aos seus parceiros/casamentos (Casa VII); por estar dignificado em Áries, Marte sugere abundância de recursos, mas a natureza ígnea e cardinal do signo também implica alguma imprudência na sua gestão.
Natividade de Florbela Espanca |
Convém esclarecer que em ambos os casos, o planeta regente que apresentamos como exemplo encontra-se posicionado numa casa que também rege. No mapa de Agatha Christie, Vênus rege também a Casa III, que tem a cúspide em Balança; no mapa de Florbela Espanca, Marte rege também a Casa VII, cuja cúspide é Carneiro. Estes posicionamentos reforçam a significação do planeta.
As outras dignidades essenciais podem também “reger” as Casas de um mapa. Assim, para além do seu regente, a Casa tem também um “regente” por exaltação, três por triplicidade, um por termo e um por face.
Destes, destaca-se principalmente o “regente” por exaltação, que pode em determinados casos adquirir o estatuto de co-regente da Casa. As triplicidades da Casa (ou seja, os três regentes do elemento do signo da cúspide) são usadas em interpretações especializadas. O termo é usado apenas em casos pontuais, enquanto o “regente” por face é, regra geral, ignorado, por ser considerado uma dignidade muito “fraca”.
Por exemplo, no mapa de Florbela Espanca, a Casa VII, cuja cúspide está a 14°20’ de Carneiro tem, além do regente do signo - Marte -, um regente por exaltação - o Sol -, três regentes por triplicidade - Júpiter, o Sol e Saturno (regentes da triplicidade de Fogo) -, como regente do termo - Mercúrio - e como face - o Sol.
E também possível calcular um almuten para a cúspide de cada Casa. Por vezes este almuten é um planeta diferente do planeta regente, caso em que será considerado um co-regente nos assuntos da Casa. O regente “normal” continua a ter a prioridade na interpretação, mas o almuten tem também algo a acrescentar.
Note-se que o almuten será sempre o trono ou a exaltação do signo. Este fato apenas reforça o papel de co-regente da exaltação.
Voltando ao exemplo anterior, a Casa VII de Florbela tem como almuten o Sol, pois este recebe 8 pontos por ser simultaneamente exaltação, triplicidade e face a 14°20’ de Carneiro. Marte, o regente da casa (e do signo) apenas recebe 5 pontos.
Neste caso o Sol participa como co-regente da Casa, o que contribui não só para a natureza “ígnea” dos relacionamentos de Florbela Espanca (Sol em Sagitário), como também para um interesse em parceiros importantes ou com algum estatuto (Sol).
Signos interceptados
É muito comum que uma Casa contenha dois signos: aquele onde está a cúspide e parte do seguinte. Por vezes acontece que uma Casa tem início num signo, prolonga-se por outro e só acaba num terceiro. Neste caso, o signo do meio tem os seus 30° totalmente contidos na Casa. Este fenômeno denomina-se intercepção, sendo o signo que fica inteiramente contido na Casa um signo interceptado. O signo interceptado tem co-participação nos assuntos da Casa, e o mesmo acontece com o planeta que o rege.
Signo interceptado (Gêmeos e Sagitário) |
No caso de Nietzsche, o signo de Sagitário está interceptado na Casa I (que começa a 29° de Escorpião e termina a 5º de Capricórnio). Por esta razão, Júpiter, o regente de Sagitário, torna-se co-regente da Casa I, juntando-se a Marte (regente de Escorpião), que é o regente principal. Note-se que o Escorpião, apesar de ocupar apenas um grau da Casa I, é mais importante que o Sagitário, pois como já referimos, não é a quantidade de graus que conta, mas o signo da cúspide. Por outro lado, o Capricórnio não tem qualquer significação nos assuntos da Casa I, sendo contudo determinante da II.
Importa reter que a situação de co-regência só ocorre quando existe um signo interceptado na Casa; noutros casos, as qualidades do segundo signo transferem-se para a Casa seguinte.
Observando o mapa torna-se também óbvio que a intercepção afeta sempre dois signos opostos e duas Casas opostas. No exemplo presente, se Sagitário está interceptado na I, Gémeos, o signo oposto, está interceptado na Casa VII, oposta à I.
Natividade de Friedrich Nietzsche |
Interação Casa-Planeta
As Casas são fundamentais para aquilo que se designa determinação específica ou acidental, isto é, a função particular do planeta num dado horóscopo. Esta determinação pode ocorrer de duas formas:
1 - Por posicionamento
Ao estar posicionado numa determinada Casa, um planeta tem como principal foco de expressão a área de vida representada por essa Casa. O planeta passa a caracterizar a atividade da Casa, determinando com a sua natureza (e qualidades) comportamentos, personagens, acontecimentos, etc.
2 - Por regência
Ao reger uma ou mais Casas, um planeta fica determinado como representante dos assuntos das Casas que rege, independentemente da sua posição no mapa astrológico.
Por exemplo, no mapa de Florbela Espanca, Mercúrio está posicionado na Casa II, pelo que se considera que atua na área dos recursos (determinação por posicionamento); por outro lado, Mercúrio rege também a Casa IX neste mapa, o que faz deste planeta um significador específico de estudos, religião e viagens (determinação por regência).
Esta determinação acidental é a chave-mestra para a delineação e interpretação astrológica, pois vai definir com maior precisão os significados dos planetas. Associa-se assim o significado natural (ou universal) do planeta à sua função específica no horóscopo.
No exemplo presente, podemos dizer que os recursos de Florbela Espanca estão relacionados com atividades da natureza de Mercúrio (escrita, comunicação, linguagem, etc.) e também estão associados aos assuntos da Casa IX, regida por Mercúrio (estudos, etc.).
Esta interpretação vai juntar-se à que foi dada num exemplo anterior, no qual se relacionavam os recursos desta poetisa aos seus parceiros/casamentos (Marte, regente da II, na VII). Numa interpretação astrológica, estas informações combinam-se para descrever a dinâmica de recursos representada neste mapa.
Os planetas nas Casas
Antes de interpretar, há que determinar em que Casa se encontra o planeta. De uma forma “matematicamente” rigorosa, um planeta localiza-se numa Casa quando está posicionado entre a cúspide dessa Casa e a cúspide da Casa seguinte. No entanto, a grande maioria dos autores considera que a Casa estende a sua influência até cerca de 5º antes da cúspide. Assim, se um planeta estiver a menos de 5º da cúspide da Casa seguinte, considera-se que atua nessa Casa. Esta é a conhecida regra dos 5º.
Podemos comparar um planeta nesta situação a alguém que está à porta de uma casa, mas no lado de fora. Nessa situação, a pessoa pode ter alguma atuação nos assuntos da casa, embora ainda esteja no exterior. Esta condição é mais acentuada se o planeta se localizar no mesmo signo que a cúspide.
Regra dos 5º |
Nota: a regra dos 5º aplica-se apenas às Casas, não aos signos. Considera-se que um planeta está posicionado num signo desde os 00°00'00" até aos 29°59'59" desse signo. No caso dos signos não há qualquer "margem de manobra".
Signos e Casas são dois referenciais diferentes e têm regras distintas.
O posicionamento dos planetas nas Casas dá-nos duas informações distintas: por um lado, diz-nos em que área da vida o planeta atua (como vimos anteriormente), por outro, diz-nos qual a sua intensidade no contexto geral do horóscopo. Com efeito, a colocação por Casa é a chave para o nível de expressão de um planeta, podendo intensificá-la ou diminui-la.
Neste caso há duas situações a considerar: a angularidade e os júbilos.
Grau de angularidade
O grau de angularidade do planeta é sem dúvida o fator mais determinante da sua força de expressão. Como já referimos neste capítulo, um planeta pode ter três graus de angularidade: angular, quando posicionado nas Casas I, X, VII ou IV; sucedente, nas Casas XI, VIII, V ou II; cadente, nas Casas XII, IX, VI ou III.
Um planeta com posição angular ganha um destaque muito grande no contexto geral do mapa, sobrepondo-se muitas vezes a todos os outros fatores. Inversamente, um planeta cadente é considerado muito fraco, tendo pouca representação no contexto geral do mapa. Os planetas em posições sucedentes têm, obviamente, uma força intermédia entre estes dois extremos.
Os júbilos
Para além da angularidade, existe um outro tipo de posicionamento que confere ao planeta uma relevância especial: o júbilo. Diz-se que um planeta está em júbilo quando se encontra numa Casa cuja significação tem grande afinidade com a sua natureza. Quando localizados nessa Casa, o planeta adquire maior força de expressão.
Cada planeta tem o seu júbilo numa única Casa, sendo esta conhecida como a “moradia” ou “templo” do planeta:
Mercúrio, significador da mente, tem o seu júbilo na Casa I, da persona, do indivíduo.
A Lua, planeta mais rápido e mutável, tem o seu júbilo na Casa III, pois esta é a Casa do movimento, das pequenas deslocações e da comunicação.
Vênus, planeta do amor e do prazer, expressa o seu júbilo na Casa V, dos amores, jogos e romances.
Marte, planeta da guerra e do esforço tem o seu júbilo na Casa VI, das doenças e da servidão.
Os júbilos |
O Sol, senhor dos céus, fonte de luz e vida, tem o seu júbilo na Casa IX, da fé, religião e visão.
Júpiter, a benéfica maior, tem o seu júbilo na Casa XI, dos aliados, amigos e esperanças.
Saturno, portador de limitações e maléfico maior, tem como júbilo a Casa XII, das tribulações, condicionamentos e prisões.
Assim, em Astrologia Tradicional a Casa V, por exemplo, pode ser referida como o templo de Vênus ou o júbilo de Vênus. Outros sinônimos comuns para júbilo são “gáudio”, “gozo” ou “alegria”.
Nota: não confundir os júbilos por Casa, que aqui apresentamos, com os júbilos por signo, mencionados no capítulo VI. Os júbilos por signo referem-se a um estado particular de dignidade essencial do planeta, enquanto que os júbilos por Casa estão relacionados com uma afinidade entre a natureza do planeta e os significados da Casa onde jubila.
A facção nos júbilos |
O sistema de júbilos reflete também a simetria natural dos planetas.
Assim, os planetas noturnos (Lua, Vénus e Marte) têm o seu júbilo em Casas abaixo do horizonte (III, V e VI), enquanto os diurnos (Sol, Júpiter e Saturno) o têm acima do horizonte (IX, XI e XII).
Este sistema realça também a afinidade entre os planetas da mesma natureza, que são posicionados em casas opostas. Assim, o par Sol-Lua, os luminares, estão colocados nas Casas IX e III, respectivamente; o par Júpiter-Vênus, os benéficos, no eixo XI-V, reforçando a natureza afortunada destas Casas; o par Saturno-Marte, os maléficos, no eixo XII-VI, sublinhando a faceta menos agradável destas Casas.
Note-se também que as posições de júbilo favorecem as Casas consideradas menos “fortes”: há júbilos nas quatro Casas cadentes (Lua na III, Marte na VI, Sol na IX e Saturno na XII) e em duas das sucedentes (Vénus na V e Júpiter na XI). Das Casas angulares, que por si só são consideradas as mais fortes, apenas a primeira (Casa I) é júbilo de um planeta (Mercúrio).
As "tristezas" dos planetas
Alguns autores tradicionais afirmam que a Casa oposta ao júbilo de um planeta é a Casa da sua "tristeza"; nesta, o planeta estaria numa posição mais débil.
Embora pareça ter um fundamento lógico (pois repete os pares trono-exílio, exaltação-queda do sistema de dignidades), este conceito é pouco funcional em termos práticos.
Por exemplo, Júpiter, planeta da fertilidade e da abundância, teria a sua "tristeza" na Casa V (oposta da XI, do seu júbilo); no entanto, em termos práticos, o posicionamento do planeta da fertilidade na Casa dos filhos é muito favorável. Do mesmo modo, o posicionamento de Vênus na Casa XI (onde estaria em "tristeza") é tradicionalmente interpretado como "casamento por amor", representando portanto uma situação bastante feliz.
Este é um bom exemplo de como nem sempre a pura dedução lógica se aplica ao sistema astrológico.
Note-se também que os autores mais antigos não fazem menção às "tristezas" dos planetas, o que sugere tratar-se de um desenvolvimento mais tardio (provavelmente do final da Idade Média).
Interação entre dignidade essencial, angularidade e júbilo
Importa referir que o destaque conferido ao planeta pela condição de angularidade ou júbilo não modifica o seu estado essencial (dignidade ou debilidade). Estas condições podem combinar-se ou reforçar-se, mas nunca se anulam.
Assim, mesmo que esteja debilitado por posição zodiacal (queda, detrimento, etc.) um planeta pode ainda assim estar destacado no mapa, por estar angular ou em júbilo. Inversamente, um planeta em excelentes condições zodiacais (em trono ou exaltação) pode ver a sua força diminuída por estar numa Casa cadente.
Vejamos primeiro a interação entre o júbilo e o estado essencial do planeta.
A Lua em júbilo e exaltada é, obviamente, um planeta muito forte neste horóscopo. Representa uma grande capacidade em concretizar (Touro) as suas ideias (nomeadamente através do jornalismo e dos livros, assuntos naturais da Casa III).
Quanto a Júpiter, a situação é diferente: por um lado está fortalecido pelo júbilo, por outro está enfraquecido pela queda. Estes dois fatores, aparentemente contraditórios, combinam-se, contribuindo para a interpretação. O posicionamento de Júpiter por júbilo sugere que o indivíduo tem aliados (Casa XI) com bastante poder; contudo, como o planeta está debilitado, podemos deduzir que estes aliados, ainda que fortes, são inconstantes e prometem mais do que podem cumprir.
Natividade de Karl Marx |
Uma situação semelhante pode ocorrer com planetas debilitados mas angulares: embora um planeta angular tenha sempre uma expressão evidente, se a sua natureza essencial estiver debilitada, tenderá a expressar o seu lado mais difícil. No mapa de D. Sebastião, por exemplo, temos o Sol angular (conjunto ao Ascendente) mas debilitado (em queda e peregrino em Aquário). A angularidade do Sol confere a este rei autoridade e radiância naturais, mas estas qualidades tendem a tornar--se impositivas, descabidas, ou mesmo arrogantes devido à debilidade essencial do Sol (esta situação é ainda reforçada pela conjunção do Sol com o colérico Marte).
Quanto aos planetas dignificados mas cadentes, ocorre a situação inversa: a expressão do planeta, ainda que discreta, é estável, equilibrada e de boa qualidade.
Helena Avelar e Luis Ribeiro, in Tratado das Esferas. Editora Pergaminho. Cascais, Portugal, 2007.
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