sábado, 20 de agosto de 2016

Focalização Através das Regências da Carta, por Dane Rudhyar


Antes de concluirmos este capítulo, há mais um ponto que precisa ser mencionado, pois ocupa um, lugar importante na prática da astrologia medieval e moderna: a questão das regências planetárias.

O princípio de regência planetária baseia-se na ideia de que os modos básicos de atividade biológica e psicológica (planetas) têm diversos tipos de "afinidade" com os tipos básicos de substância vital (signos do zodíaco). Afinidades desse tipo foram determinadas na astrologia tradicional por razões nem sempre claras ou filosoficamente evidentes. Diz-se, então, que um planeta "rege" um, ou normalmente dois, signos zodiacais, que são considerados os "domicílios" do planeta. Diz-se que o planeta está "exaltado" num outro signo. A essas avaliações positivas são acrescentadas avaliações negativas. No signo oposto ao seu signo de regência, o planeta está em "exílio'; no signo oposto ao seu signo de exaltação, diz-se que o planeta está em "queda". As avaliações positivas são chamadas dignidades; avaliações negativas, debilidades. As acima mencionadas são as mais importantes dentre as dignidades e debilidades, são dignidades ou debilidades "essenciais". A estas, no entanto, se acrescenta uma série de debilidades ou dignidades "acidentais", como as que decorrem de o planeta estar numa casa angular e bem aspectado ou não afligido, de ele ter movimento rápido, estar aumentando em luz etc.

O valor destas qualificações é óbvio. Permite ao astrólogo atribuir valores quantitativos aos planetas e assim determinar sua importância e peso relativos numa certa situação ou na composição de uma determinada personalidade. Assim, um Saturno "fraco" não será capaz de neutralizar um Júpiter "forte", e em todos os aspectos entre esses planetas a qualidade jupiteriana terá peso maior. Surgirá portanto um tipo de perspectiva tridimensional a partir do reconhecimento deste fator quantitativo. Alguns planetas se destacarão como estrelas de primeira grandeza, outros passarão para segundo plano, como estrelas de grandeza menor. Assim também se torna possível um certo tipo de "determinação focal", como no caso de um planeta muito dignificado entre irmãos ou irmãs fracos.

A dificuldade surge na justificação filosófica ou "holística" das avaliações tradicionais. Por causa dessa dificuldade é que se inventam novos sistemas de "regência" com tanta freqüência, geralmente numa tentativa de remediar duas das evidentes fraquezas do sistema: o fato de Sol e Lua regerem apenas um signo cada um, enquanto os outros planetas, até Saturno inclusive, regerem dois signos cada um; e o outro fato: os planetas recém-descobertos (Urano, Netuno e Plutão) não regerem nehum signo definido, ou, se a regência de um signo lhes é atribuída (como Aquário a Urano e Peixes a Netuno), então dois dos antigos planetas ficam com a regência de apenas um signo. Mas a confusão parece pior do que é na realidade, e poderemos ser capazes de esclarecer muito da dificuldade aparente.

Primeiramente colocaremos o esquema tradicional de regências — acrescentando, logo de início, que os signos positivos (contados alternadamente a partir de Aries) são chamados de casas diurnas dos planetas, e os signos negativos de casas noturnas.


Isto demonstra de imediato que Sol e Lua são considerados uma unidade, em termos de regência. Eles sempre estiveram numa categoria especial, como as "luzes" — uma valoração que, como já dissemos várias vezes, é uma expressão da antiga astrologia geocêntrica interpretando fenômenos celestes do modo como são vistos, e não em termos de um conhecimento científico intelectual, como o que hoje constitui a astronomia heliocêntrica.

Agora podemos repetir a mesma tabela, mas desta vez atribuindo aos três planetas recentemente descobertos a regência de signo que pareceu apropriada à maioria dos astrólogos contemporâneos:


É fácil ver que o que está acontecendo é que, seguindo o exemplo do par Sol—Lua, cada um dos planetas tradicionais está recebendo um "par" ao qual é delegada a regência de uma das duas "casas" que originalmente eram seu domínio. Disto se deduz um novo tipo de parceria planetária. Num capítulo precedente, estudamos o entrelaçamento tradicional de Saturno e Lua, Júpiter e Mercúrio, Marte e Vênus. Modificamos esse arranjo de modo que a Terra coerentemente fosse o centro ou eixo dos pares formados entre planetas "interiores" e "exteriores": Marte—Vênus, Júpiter—Mercúrio, Saturno—fotosfera solar; e os três "planetas do inconsciente" — Coração do Sol. Neste último esquema, deduzido a partir da estrutura do sistema solar conhecida pela astronomia moderna, a Lua — como satélite da Terra — torna-se o fator de ligação entre os planetas intraorbitais e extraorbitais.

E agora vemos um outro tipo de acoplamento surgindo a partir do quadro B. Porque Sol e Lua eram respectivamente a "luz do dia" e a "luz da noite", o Sol logicamente rege um signo positivo (diurno) e a Lua um signo negativo (noturno). Disso pode-se derivar uma explicação geral do emergente processo de polarização de todas as regências planetárias.

Reconsideremos o quadro A e imaginemos que a Lua não seja incluída e que o Sol tenha suas casas diurna e noturna (Leão e Câncer), como todos os outros planetas. Teremos então a série de planetas em sua ordem real, começando com o Sol e terminando com Saturno (não contando, é claro, nossa Terra). Se, por outro lado, correlacionarmos essa série com a série de signos zodiacais começando por Leão, teremos um arranjo muito bem organizado, no qual os planetas recentemente descobertos se encaixam bem — exceto que Plutão regeria Aries e não Escorpião:


Acreditamos que um arranjo como esse é do maior significado, mas apenas em termos do Homem—Indivíduo, ou de consciência. Os primeiros seis termos de ambas as séries referem-se ao consciente. Começando por Leão no caminho para a individualização com grande espontaneidade solar, o Homem chega em Capricórnio à individualização plena e concreta com um "eu sou" — num sentido pessoal ou planetário. Então ele começa a assimilar o além, os conteúdos do inconsciente coletivo — e este é o caminho para a individuação. Através de Urano, elementos universais fluem para dentro de cada ego; através de Netuno, as paredes do ego se tornam translúcidas para o além (ou, muito desafortunadamente, dissolvem-se por completo); através de Plutão, dá-se um novo início: a Ordem universal nasce no núcleo do particular transfigurado. A Lua, no fim dessa série incompleta, obviamente representa aquele princípio de relacionamento universal que marca o fim do caminho de individuação, tal como Saturno representou o princípio de relacionamento numa forma estabelecida que marca o fim do caminho para a individualização. Obviamente, a Lua é, na verdade, apenas o aspecto negativo desse princípio de relacionamento universal. Ela simboliza apenas a maternidade fisiológica e a integração de agentes vitais elementais; enquanto o que quer que seja venha a tomar seu lugar no final da série que começa com Aquário deveria representar a Maternidade espiritual e a integração de forças Vitais universais e Ideias no nível psicomental ou espiritual — portanto talvez a Galáxia (Via Láctea).

Olhando para o quadro B de um outro ângulo (e agora invertendo os lugares de Marte e Plutão), também podemos dizer que Saturno está para Urano, Netuno para Júpiter, Marte para Plutão, tal como a Lua está para o Sol. Colocada deste modo, a situação também é bastante clara e significativa. Urano é a respiração do "eu sou" criativo, do qual o ego meramente consciente é apenas um tipo de reflexo noturno, tal como a Lua reflete de um modo pálido o fogo integrador do Sol. De maneira semelhante, Plutão representa inícios cósmicos de um modo tal que Marte e seus impulsos, limitados por condicionamento fisiológico, refletem apenas fracamente e de um modo pessoal. Quanto ao par Júpiter—Netuno, pode-se ver que a função de dissolução da forma, simbolizada por Netuno, precisa ser considerada como o polo negativo (ou noturno) da função jupiteriana de expansão dos conteúdos vitais da forma.

Seja como for, a interpretação acima — ainda que provavelmente não aceitável para todos — fornece ao menos um quadro coerente que vale a pena estudar em todas as suas implicações. Outros estudantes de astrologia poderão preferir a posição de Marc Jones, recusando-se a atribuir qualquer regência a Urano, Netuno ou a quaisquer planetas transaturninos que sejam descobertos, porque a própria ideia de regência não é coerente com os significados de tais planetas. Regência é o símbolo de relacionamento orgânico entre a atividade e a substância organizada envolvida em tal atividade, e ali onde os planetas se referem ao transorgânico (aquilo que está além dos limites de qualquer todo orgânico), não pode haver questão de regência. No entanto a resposta para isto é que há um organismo suprafisiológico em formação em indivíduos que atingiram um certo ponto de seu desenvolvimento e que os planetas transaturninos são transorgânicos apenas à medida que se refiram ao organismo fisiológico, mas são os próprios agentes formativos que estão construindo, em todos os homens sintonizados com sua natureza criativa-positiva, um organismo psicomental.

Enquanto esses tipos de "regência de carta" podem de fato revelar muito significado, preferiríamos ressaltar o tipo de "determinação focal" discutida no capítulo "A forma e o padrão dos aspectos planetários" — isto é, um tipo de determinação que escolhe alguns traços-grupo da carta como um todo, e considera esse traço como o ponto focal de interpretação. Por exemplo: na carta de Mussolini, diríamos que o fato de todos os planetas estarem contidos no trigono entre Urano e Netuno e de todos eles, exceto Urano, estarem localizados no quadrante sul-oeste, constituem a "determinação focal" significativa. Estes fatos centralizam os múltiplos significados dos muitos elementos astrológicos em torno de um significado primordial, e disso surge um tipo de perspectiva de interpretação que nos parece mais válida ou mais reveladora — ao menos na visão de nossa abordagem da astrologia — que aquela que resultaria da atribuição de valores quantitativos de força ou debilidade a cada planeta separadamente.

Conclusão

Com este rápido estudo de alguns dos princípios mais importantes sobre os quais se pode constituir uma técnica de interpretação astrológica, precisamos concluir esta parte dedicada a uma reformulação e reinterpretação dos elementos fundamentais do simbolismo astrológico. Astrologia, definida como uma álgebra da vida, é absolutamente versátil em sua manifestação e múltipla na grande diversidade de suas abordagens a fases específicas de interpretação. Razão pela qual sentimos muito fortemente o quanto a reformulação apresentada nos capítulos desta segunda seção foi incompleta. Mesmo assim, estamos certos de ter estabelecido fundamentos numa base coerente tanto de entendimento simbólico-lógico quanto psicológico, e poderemos ter, num futuro não muito distante, condições de fazer um estudo mais extensivo e relacionado com mais exemplos práticos de alguns dos fatores astrológicos cujo significado delineamos aqui.

Mas aqui, mais uma vez, podemos acrescentar — como repetição final — que em sua essência a astrologia não está presa a nenhuma aplicação específica ou campo específico de aplicação; que suas verdades não são empíricas em seu caráter e nem dependem, para seu sucesso, de um ou outro campo de vida. É concebível que os físicos descubram que sua abordagem do problema da determinação da natureza do átomo ou de galáxias distantes esteja totalmente errada e que suas experiências tenham sido planejadas de modo a desconsiderar o principal fator de comportamento intra-atômico ou cósmico. Mas uma descoberta como esta não invalidaria de nenhum modo a álgebra dos conjuntos ou quaisquer dos símbolos matemáticos usados para estabelecer as interpretações atuais, e poderiam ser utilizados para constituir novas teorias. O número dez continua um símbolo válido, mesmo se dez maçãs por ele agrupadas numa relação numérica acabarem sendo pêssegos. Considere do mesmo modo uma quadratura entre Júpiter e Saturno; hoje podemos dizer que ela se refere a "provas e tribulações espirituais", mas essa afirmação só tem validade em termos daquilo que chamamos provas e tribulações no nosso entendimento da psicologia humana. Modifique esta psicologia e o significado da quadratura mudará.

E, finalmente, a astrologia não oferece interpretações tão claras e objetivas quanto a física moderna. O ideal da ciência moderna é anonimato e objetividade — isto é, a total supressão do elemento individual. Isto, no entanto, não significa que a ciência moderna não nos dê "interpretação", pois as assim ,chamadas "leis científicas" são, afinal, interpretações generalizadas de processos e acúmulos de fatos. Mas, essas interpretações generalizadas — obtidas através de simbolização matemática — não são consideradas realmente válidas enquanto existir alguma exceção conhecida, e até que seja possível uma segurança relativamente absoluta de que os processos futuros sempre funcionarão, nos termos das leis, para todos os casos a que se apliquem.

Como resultado, a ciência moderna fica obrigada a ignorar a individualidade de qualquer entidade viva. Ela reduz qualquer entidade a seu tipo genérico e ignora ou nega o fator individual e seu caráter único. E o que é que é único em qualquer totalidade viva? A principio, no processo evolutivo que vai da ameba ao homem, é apenas um detalhe infinitesimal de disposição orgânica. Então, à medida que a evolução prossegue em seu curso em direção à diferenciação maior, o pequeno detalhe individual da superestrutura é ampliado até que um sistema orgânico se torne adequadamente desenvolvido para a diferenciação individual. A superestrutura individualizadora não só se funde com a estrutura genérica, mas a influencia cada vez mais.

Então encontramos no homem, dentro de sua estrutura orgânica total, uma subestrutura genérica (o sistema grande simpático) e uma superestrutura individual (o sistema cérebro-espinhal), e se vê que esta domina cada vez mais a anterior. Dizemos então que "mente domina matéria", que significa, em grande parte, que o individual rege o genérico ou coletivo, especialmente quando nos referimos à "mente" como "Mente Universal", que simplesmente é a totalidade operacional do "Indivíduo Maior" emergindo lentamente a partir do processo evolutivo planetário como uma "Pessoa Maior", — o Deus do fim do ciclo planetário.

A astrologia, como a entendemos, complementa a ciência moderna à medida que lida essencialmente com a superestrutura individual mais que com a subestrutura genérico-coletiva. Através do estudo do "primeiro momento" do ciclo de vida, ela atinge o ser individual e a forma individual, e por fazer isso ela é também capaz de desvendar o mistério do significado, que é um fator puramente individual. O que ela é capaz de apreender do processo vital de vir-a-ser é, principalmente, em termos de períodos estruturais de destino, mais que em termos de eventos concretos estabelecidos. Mais do que isso, a astrologia pode conhecer realmente apenas o modo como esse processo do vir-a-ser se apresenta para o ser individual. Ela não conhece eventos em si, tanto quanto crises na curva de um destino individual. Em outras palavras, através desse conhecimento da forma, ela revela o indivíduo ao individuando e leva o individuando a uma percepção do significado individual da individuação como processo.

É isto o que significa "interpretação da vida". E a percepção da forma individual e do significado individual por uma personalidade em evolução ou individuação. Esta personalidade é um composto, um agregado de fatores e elementos. À medida que estes se harmonizam por essa "interpretação da vida" revelando sua forma e significado individuais em potencial, emerge a Pessoa Viva completada e integrada. Permitam-nos repetir, mais uma vez, que é o surgimento dessa Pessoa Viva que constitui a meta da astrologia — ou ao menos daquela astrologia que chamamos de Astrologia Harmônica.

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Extraído do livro Astrologia da Personalidade, de Dane Rudhyar.

sexta-feira, 19 de agosto de 2016

Quanto ao Procedimento da Interpretação, por Dane Rudhyar



Do ponto de vista da fase analítica da interpretação — e sempre deveria haver uma fase assim, mesmo apenas para conferir o que foi revelado por percepção "holística" —, pouco precisa ser acrescentado ao que já foi dito nos capítulos anteriores. Os dois passos fundamentais da análise referem-se respectivamente à "forma subjetiva", constituída pela relação entre a roda de casas e os signos do zodíaco (isto é, as posições zodiacais das cúspides, signos interceptados etc.), e à "forma objetiva", constituída pelas posições zodiacais (signos e graus) e posições de casa dos planetas, isoladamente e como um grupo. Estes dois passos da análise devem ser seguidos por um terceiro, como resultado do que serão determinados os "fatores de relação" secundários entre planetas, órbitas planetárias e cúspides: Nodos e Partes.

Segue-se então o que chamamos análise de tempo da carta de nascimento, estabelecendo uma "estrutura de vir-a-ser" geral, como uma expressão da individualidade fundamental do nativo. Isto deveria ser seguido e modificado por um estudo dos períodos determinados ou sugeridos pelos movimentos progredidos de todos os planetas radicais e pelos movimentos em trânsito dos planetas mais lentos (Plutão, Netuno, Urano, Saturno, Júpiter) através da duração de vida esperada do nativo.

Dissemos "um estudo dos períodos" desses planetas progredidos e em trânsito de propósito, pois o que tem valor neste estágio do processo de interpretação é determinar a forma geral do vir-a-ser da personalidade e uma fórmula geral mostrando os ciclos durante os quais o mundo exterior (o coletivo, a sociedade, as condições planetárias) promoverá e aqueles durante os quais dificultará (ou aprofundará, por oposição e desgaste) o desenvolvimento da personalidade como um todo e em relação às suas várias funções básicas.

Os períodos de progressões planetárias são os fatores componentes desta "forma de vir-a-ser personalidade" — e não qualquer aspecto entre dois planetas progredidos. Um certo aspecto situado num certo signo e casa (ou geralmente em dois signos e duas casas) pode ter significado em termos de um certo tipo de evento ou série de eventos. Mas seu significado é tão entrelaçado com o significado de uma dúzia de outros fatores, há tantos modos possíveis de interpretar sua operação provável e localizá-la, tanto no campo fisiológico quanto no psicológico — seja em termos de ênfase pela falta de algo, seja pela ênfase no excesso daquela coisa —, que um prognóstico absolutamente correto de eventos por progressões, direções e trânsitos é praticamente impossível. É possível e assustadoramente preciso em alguns casos, mas desgraçadamente impreciso, ou no elemento tempo ou na maneira de sua expressão concreta, num número igual de casos. Portanto, quando alguém percebe a grande influência que, em termos psicológicos, uma previsão pode exercer sobre uma pessoa sensível — e todos somos influenciáveis, alguns inconscientemente, outros conscientemente —, deveria também dar-se conta do quanto uma previsão errada pode ser nefasta.

O valor da astrologia não depende de seu rigor de previsão, pois então ela teria relativamente pouco valor, exceto nas mãos de astrólogos espetacularmente dotados, capazes de, por uma combinação de astrologia "horária" e "natal", "acertar na mosca" numa maioria assustadora de casos. Depende mais do fato de nos fornecer "fórmulas" de ser (carta de nascimento) e de vir-a-ser (análise de tempo, progressões etc.) que nos permitem extrair o maior significado daquilo que está acontecendo ou do que jd aconteceu. Se assimilarmos esse significado perfeitamente, então seremos capazes de enfrentar seja o que for que vier a acontecer: 1) com uma frente integrada, unificada; 2) como um portador de significado criativo. Ao fazer isto, seremos capazes de "transfigurar" o futuro, não mudando a "forma" de nosso ser ou vir-a-ser, mas fazendo esta forma brilhar de significado, harmonia e luz — como Jesus brilhou no Monte da Transfiguração. Ele brilhava de luz crística, com o poder das energias e conteúdos universais — mas Ele permanecia, em forma e individualidade, Jesus: Jesus que se tornou "Cristo".

Mas voltando aos períodos das progressões. Se vemos na carta de Mussolini que aos 46 anos, seu Sol progredido faz conjunção com Urano e trígono com Netuno, isto pode não nos dar tanta informação direta quanto aos eventos que podem ocorrer então. De fato, do quanto é possível entrever a partir de sua vida externa, relativamente pouco correspondeu nessa idade a um aspecto progredido que deveria ser capital na vida de Mussolini, considerando que o trígono Urano-Netuno engloba todos os seus planetas, e assim tem um papel da maior importância em seu ser e destino. É verdade que o acordo com o Papa foi assinado (11/02/1929) por volta do tempo de maturação dos aspectos progredidos, mas, supondo que seja esta a correlação desejada, como um astrólogo que estudasse sua carta, digamos em 1900, poderia ter previsto um evento concreto como esse? Além disso, por que esse tratado teria, astrologicamente, tanto significado no destino de Mussolini? Mas podemos abordar as progressões solares acima mencionadas de outro modo.

Podemos determinar os aspectos formados pelo.Sol progredido desde o nascimento. Para começar pelos mais recentes: em 1916, o Sol progredido faz quadratura com Saturno radical; em 1917, com a Lua radical; em 1922, com Marte radical; em 1923, entra em conjunção com a parte da Fortuna; em 1927, forma sextil com Júpiter; então em 1929 faz trígono com Netuno e conjunção com Urano; e, em 1930, sextil com Vênus. São então determinados períodos de progressões considerando o tempo decorrido entre cada dois aspectos. O período de quadratura Sol-Lua opera de 1916 a 1917; o período de quadratura Sol-Marte termina em 1922. Finalmente o período de conjunção Sol-Parte da Fortuna começa testemunhando a "marcha sobre Roma" e a ascensão de Mussolini ao poder pessoal.

Todos os períodos antes deste são baseados em aspectos de quadratura — desde a quadratura de Sol progredido com Netuno em 1898 (15 anos), e, antes dessa série da quadraturas, houve apenas sextis (com Lua e Marte). Isto estabelece imediatamente — à luz das progressões solares básicas — vários ciclos de vida bem marcados. Até os 15 anos de idade, um período de sextis — a rotina do crescimento sob influência materna (Lua) e paterna (Marte). Então, de 1898 até o início da primavera de 1922, temos um período de luta para manifestar um ideal, para surgir como uma figura de destino: quadraturas, símbolos de encarnação e involução.

O ano de 1922 é dominado por um novo tipo de aspecto: a primeira conjunção solar — com a Parte da Fortuna. Isto agora significa "ênfase". Ênfase em quê? Naquilo que a Parte da Fortuna representa. A Parte da Fortuna é o "Ascendente" da Lua. Ela "distribui" e focaliza o poder da Lua. A Lua representa a vida da personalidade como um elemento da evolução, representa também "o público", o coletivo confrontando o indivíduo. Assim o período de ênfase ou destaque apontado pela conjunção Sol-Parte da Fortuna focalizou o poder da coletividade sobre a individualidade de Mussolini, destacou o poder de sua própria personalidade. Na décima casa, enfatizou a autoridade e a atividade pública; em Virgem, um processo de limpeza (até simbolizada pelos fascistas usando óleo de rícino com políticos não-dispostos a cooperar).

No entanto seria inútil encontrar um dia ou mês em que essa conjunção opera especificamente. O que deve ser entendido é mais o significado geral de um período. Mesmo quando falamos do sextil entre Sol progredido e Júpiter, referimo-nos ao período de 1923 a 1927, um período de estabelecimento (sextil) de autoridade (Júpiter). Então, de 1927 a 1929, chegamos ao período de Sol progredido em trígono com Netuno e conjunção com Urano. Obviamente temos então um período durante o qual o poder do inconsciente coletivo é predominante. Todos os planetas de Mussolini estão fechados no trígono Urano-Netuno. Quando o Sol chega à conjunção com Urano, obviamente finaliza um período de ênfase pessoal e continua, indo ao desconhecido, por assim dizer, para aquilo que é não-destacado e não é demonstrado por atividades planetárias. Então Mussolini ultrapassa aquilo que ele é como uma personalidade, mas, antes de fazer isso, ele deu acabamento à sua vida pessoal tomando algumas medidas que fecham um período e abrem outro. Este é o significado do Tratado de Latrão, um significado netuniano, sutil, de ubiquidade, e do estabelecimento definido do "Estado associado" italiano, que, mesmo tendo sido delineado durante o período de Júpiter (1926-1927), se implanta na mente da nação e em seu inconsciente coletivo só depois de 1927.

O período do sextil Sol-Vênus também é um período muito curto. Presumivelmente refere-se à vida emocional de Mussolini, mas acrescenta significado individual àquilo que primeiramente se referia a grandes fatores inconscientes (sob os aspectos do Sol com Urano e Netuno). Depois disso começa um novo período, caracterizado pelo trígono do Sol progredido com Plutão, depois com Saturno, Lua e Marte. Estes períodos são expansivos. Referem-se à formação de novos ideais, de novos relacionamentos, de novas alianças. O futuro dirá se eles devem ser interpretados negativa ou positivamente. Em 1939, o Sol progredido está programado para entrar em Libra, então Mussolini terá 56 anos. Este será o final de um período de sua vida que começou em 1908, quando ele foi para Trento.

Uma análise semelhante poderia ser elaborada considerando-se não apenas o Sol progredido, mas todos os planetas progredidos, e também estudando os movimentos dos planetas lentos, após o nascimento, quando transitam sobre pontos importantes do mapa radical. E claro que aqui teremos uma série de aspectos muito complexa e diversificada, e será preciso ter o maior cuidado para isolar os fatores mais significativos. Mas a ideia de que os períodos são mais significativos que os aspectos exatos que marcam seus limites também é válida — especialmente porque, com planetas lentos, estes são períodos durante os quais eles passam várias vezes sobre pontos sensíveis do mapa, por causa da alternância de movimento direto e retrógrado. Os períodos determinados pelo trânsito de um planeta lento por toda uma casa são particularmente significativos. Mostram como as circunstâncias e forças coletivas afetam basicamente as várias fases do ser e do destino individual — fases simbolizadas pelas casas.

Então, também se deve considerar os ciclos de 28 anos e de 7 anos dos eixos da carta, especialmente o que chamamos de movimento cíclico do Ponto do self. Estes ciclos podem ser estudados em termos de seu início, seu ponto central e sua conclusão. Mostram o trabalho interno do processo de individuação em seus três níveis sucessivos — às vezes referindo-se a acontecimentos concretos, mas, se for este o caso, apenas à medida que estes focalizem transições críticas no processo geral.

Finalmente, as direções primárias e certos trânsitos precisos (como eclipses e conjunções múltiplas) podem ser estudados para definir os contornos do quadro já desenhado. Existe uma escola de astrólogos que dá ênfase básica às direções primárias, e que portanto colocaria muitas objeções a relegá-las para o final do processo de interpretação como o fizemos, mas eles não devem esquecer que nossa "análise do tempo da carta de nascimento", que colocamos em primeiro lugar no estudo do vir-a-ser, fornece indicações gerais semelhantes ou quase idênticas às que se conseguem através da utilização do método mais simples de direções (ou através das direções radicais). Acreditamos que estas sejam não somente tão eficazes quanto as verdadeiras direções primárias, mas também que, dado seu número menor, sejam muito mais válidas para uma percepção estrutural do destino como a totalidade do vir-a-ser individualmente determinado e significativo. Os outros tipos de direções podem ser muito significativos numa análise detalhada, ou sempre que for necessário um estudo próximo das correlações totais dos fatores astrológicos relacionados com um evento ou período de vida conhecido, e nestes casos todos os trânsitos também precisam ser considerados. Mas, para a finalidade psicológica de integração da personalidade e interpretação da vida, as principais motivações em nossa abordagem da astrologia, as direções primárias do tipo complexo não apenas exigem muito tempo e muitos cálculos, mas sua própria multiplicidade quase lhes tira o propósito, pois, onde se tem tanto que escolher e organizar para poder determinar eventos ou significados, a atenção facilmente se fragmenta e o essencial vai desaparecendo, obnubilado pelos múltiplos não essenciais.

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Extraído do livro Astrologia da Personalidade, de Dane Rudhyar.

quinta-feira, 18 de agosto de 2016

Princípios de Interpretação Astrológica, por Dane Rudhyar



Para que a interpretação seja plenamente significativa e criativa, precisa necessariamente ser individual. Portanto, nenhum homem deveria dizer a outro homem como interpretar sua experiência ou qualquer estrutura de vida ou evento com que se confronte. Tudo o que pode ser feito é estabelecer alguns princípios gerais de interpretação que são universalmente válidos, servindo de marcos no processo de interpretação, que deveria ser determinado, para cada indivíduo, pelo modo como ele conseguiu interpretar o fato básico de sua experiência: ele mesmo.

A interpretação de uma carta de nascimento não é diferente da interpretação de qualquer situação de vida, nem da interpretação de uma obra de arte ou de uma personalidade que se encontra pela primeira vez. Isto posto, para interpretar uma carta de nascimento astrológica, a pessoa deverá, primeiro, conhecer completamente o significado dos fatos astrológicos, ou melhor, os símbolos. Assegurado que um conhecimento dos conteúdos dos capítulos precedentes deste livro seja um pré-requisito para uma interpretação fiel ao menos à atitude que sustentamos diante da astrologia, permanece o fato de não haver, em interpretação astrológica, nada mais misterioso, nem menos misterioso, que em qualquer outro caso de interpretação. Foram estabelecidos princípios universais, definindo o caráter geral dos símbolos utilizados. Resta ao indivíduo permitir que esses símbolos se organizem em totalidade de significado dentro de sua própria estrutura de compreensão.

Isto soa muito simples, mas evidentemente pode ser muito difícil. O principiante "não saberá como começar". Olhará fixamente para o mapa numa perplexidade muda, e nada acontecerá. Ou então ele tabulará cada fator em que puder pensar e procurará, nos manuais, pelo significado de cada um dos fatores. E se ele tentar somar esses significados separados, ele encontrará — salvo casos excepcionais — uma situação desesperadoramente confusa, na qual muitos fatores negarão tantos outros. Estabelecer uma média mostrará ser de pouca utilidade, já que seres humanos não são tão convenientemente simples quanto este procedimento sugeriria.

Especialmente, seres humanos não são somas totais de fatores separados, mas um relacionamento orgânico de relações entre fatores. Devemos então começar pelos "fatores", ou pelas "relações entre fatores" ou mesmo pelo "relacionamento orgânico de relações"?

Cada intérprete potencial precisa decidir por si mesmo — de acordo com a natureza de seu próprio entendimento. Alguns partirão do todo para as partes, daí para as relações entre as partes, e tornarão a considerar o todo como um organismo de relações. Outros, tão sabiamente quanto os primeiros, analisarão partes, daí às relações entre partes, e resumirão polarizando os significados já determinados em algum centro de significado, ou "determinador focal".

No entanto, existe uma operação primária, até agora não mencionada, que na verdade é o fundamento — apesar de normalmente ser inconsciente — do processo de interpretação subsequente. Esta operação está implícita no primeiro olhar dirigido a uma carta astrológica, pois cada homem, olhando para uma carta a ser interpretada, terá ou deveria ter determinado, com clareza ou não, o que está procurando, como base para investigação posterior. Com esta afirmação um tanto obtusa, queremos salientar sua atitude, a priori, diante dos dados incluídos na carta, quaisquer que sejam. Alguns intérpretes terão decidido de antemão, inconscientemente senão deliberadamente, que estão procurando planetas bons e maus, benéficos e maléficos, bons e maus aspectos, signos e estrelas felizes e infelizes. Outros procurarão o quadro de um ser humano e um destino, e interpretarão este e aquele planeta ou signo como um gravurista lida com tonalidades de preto e branco, um pintor com claro-escuro.

Em outras palavras, são possíveis duas atitudes básicas diante da interpretação — e, além disso, muitas misturas secundárias dessas duas: as atitudes ética e estética. Já definimos em geral essas duas abordagens de uma avaliação e compreensão da vida em nosso capítulo "Astrologia e psicologia analítica". O que resta fazer é mostrar brevemente como a atitude estética opera precisamente no campo da interpretação de cartas. O mecanismo da atitude "ética" pouco precisa ser discutido, já que todo manual de astrologia pós-medieval, ou mesmo moderna, e a prática astrológica comum são exemplos suficientes do método ético e de suas avaliações dualistas: bom e mau. Mas a abordagem "estética" ainda é um mistério para uma esmagadora maioria de estudantes de astrologia.

A razão disso indubitavelmente é que até agora qualquer interpretação e avaliação da vida e de seus dois elementos básicos — tais como macho e fêmea, yang e yin chineses, luz e escuridão, positivo e negativo — foi estabelecida no nível fisiológico-natural de consciência. Em outras palavras, a atitude vital humana até agora esteve baseada em seus instintos e colorida pelos resultados de atividades instintivas. Luz e verão eram bons porque a vida era mais segura e mais fácil quando ambos tinham ascendência, mas escuridão e inverno eram maus porque a vida era mais insegura e difícil quando estes dominavam. De um modo semelhante, havia uma subavaliação ética da mulher e uma superavaliação do homem, pois um homem era mais capaz de trabalhar por sua vida na "selva", e a mulher carregava o peso de dificuldades fisiológicas.

Até recentemente, a humanidade esteve no estágio estritamente fzsiol6gico de seu desenvolvimento — como vimos no primeiro capítulo deste livro. Os Puranas hindus falam deste estágio como o do "poder da mão e do sexo". Uma caracterização das mais interessantes! "Poder da mão" refere-se a atividade muscular, e em seus termos o polo passivo-mulher é visto como inferior. Quanto ao "poder do sexo", tudo depende do modo como sexo é considerado. Como manifestação da força criativa e da vida, o sexo faz da mulher, como mãe, o positivo: portanto o matriarcado. Mas como modo de "atividade" (muscular e outras), faz do homem o positivo. O tipo de ambiente em que as tribos humanas viviam sem dúvida influía muito na determinação da atitude adotada. Como resultado, temos o conflito entre o sistema matriarcal e o patriarcal.

Todos os campos de relacionamento humano, da vida familiar às organizações sociais tribal e nacional, foram permeados pelo tipo mais ou menos consciente de avaliação fisiológica. Além disso, tudo o que parecia válido para a grande maioria dos seres humanos era o esforço para perpetuar a todo custo o organismo fisiológico numa condição de relativa saúde fisiológica e felicidade psicológica. Assim, tudo que tendia a abalar — mesmo que temporariamente — a saúde e a felicidade (mais prosperidade) foi avaliado como mau, enquanto tudo que consolidava ou promovia a saúde, a felicidade e a prosperidade foi considerado bom. Tudo que fizesse surgir uma sensação de pressão ou peso, ou quaisquer distúrbios da normalidade feliz do lar, da religião e do comportamento tradicional foi rotulado de mau. Por isso Saturno e Marte são maléficos. Quadraturas são maus aspectos. Oposições e as dúvidas que geram (como estímulos necessários para subsequentes esforços de compreensão) também são maus aspectos. Mas o Júpiter expansivo e a Vênus construtora de lares são benéficos, e trígonos que trazem novas perspectivas e novos planos são bons aspectos.

Mas à medida que a consciência humana começa a se estabelecer no nível psicomental e a conceber sua relação com um Todo maior, cujo poder ela pode focalizar deliberadamente como o fundamento para a atividade suprapessoal mas consciente, a questão da manutenção do organismo físico, o problema da saúde, felicidade, prosperidade e o medo instintivo daquilo que pudesse quebrar o conforto dos relacionamentos consanguíneos e das tradições da Terra, tudo isso assume valores diferentes. Num estágio de transição, a avaliação "bom-mau" parece ser fortemente enfatizada por um tempo, apesar de haver uma transferência do foco de discriminação — como podemos ver na ética cristã, mas ainda mais tarde a vida começa a ser realmente considerada "além do bem e do mal" — e mesmo além da felicidade. Começa a ser vista à luz do artista criativo, que sabe muito bem que "pretos" são tão necessários e significativos quanto "brancos" num desenho preto e branco, que sem ambos não poderia existir nenhuma forma e portanto nenhum significado. Nasce então a atitude estética diante da vida — a atitude da "totalidade operativa", a meta da "liberação de poder através de forma significativa". Para uma atitude assim não há nem "bom" nem "mau", mas apenas graus de realização concreta de significados através de formas que transmitem tal significado de modo mais ou menos puro e preciso. Cada vida é uma obra de arte, que, ou transmite com sucesso o significado que a trouxe à existência, ou se transforma num conglomerado disforme, inexpressivo, não-convincente, trivial, desbotado, de esforços incompletos, que não levaram a lugar algum — ou ainda como uma folha quase em branco sugerindo apenas vagamente formas vulgares, totalmente não-individuais e desprovidas de significado.

As afirmações seguintes — de um modo um tanto negativo — podem servir como postulados da atitude estética diante da interpretação astrológica:

A. Não há nenhum planeta mau. Cada planeta tem uma função definida. Cada função é necessária para a conquista da totalidade orgânica. Eliminação tem tanto valor quanto assimilação. O furúnculo que livra o sistema de venenos tem tanto valor quanto a carne que arredonda os ângulos dos ossos.

B. Não há nenhum aspecto mau. A involução é tão necessária quanto a evolução. A destruição das formas que se tornaram conchas mortas e a liberação do poder que elas detinham é de tanto valor quanto a construção de novas formas. As tensões têm tanto valor quanto facilidades, e são mais criativas.

C. Cada signo zodiacal é tão bom para se nascer quanto qualquer outro. Não existe um mês melhor ou dia melhor para nascer. A única coisa que interessa é completar a função vital ou a "qualidade" revelada pelo signo ou símbolo do grau.

D. Nenhuma carta de nascimento é melhor que qualquer outra. Uma é sempre melhor para algum determinado propósito. Mas, como todos os propósitos são igualmente válidos e necessários na economia do Todo maior, a carta de cada homem é melhor para os propósitos de sua vida que a de qualquer outro.

Se existe algum "mal", ele reside na identificação absoluta da consciência e do "eu" com apenas uma fase particular da totalidade, em vez de com a totalidade do ser. Portanto o mal é a superênfase, ou melhor, é o fato do "eu" ficar escravizado a essa superênfase e influenciado por ela. Neste sentido, qualquer planeta é maléfico quando chega a um destaque que nega a operação compensatória de seu oposto polar. Qualquer elemento de uma carta, quando visto dominando totalmente e atraindo para si quase toda a energia do campo de consciência, torna-se "mau". Mais cedo ou mais tarde, seu domínio precisa ser quebrado, se o homem quiser alcançar totalidade.

Isto não invalida a "focalização". Mas focalizar a totalidade da energia de alguém para a completação de um indivíduo — e, ainda mais, de um propósito suprapessoal — é uma coisa, e identificar o "eu" pessoal com uma única parte da totalidade do ser, de forma que todas as outras partes sejam frustradas em seu desenvolvimento, é outra. Só esta última pode ser chamada má, se alguém insistir em utilizar essa qualificação tão infeliz! E mesmo essa "maldade" pode facilmente ser uma questão puramente temporária, que termina demonstrando ser uma fase valiosa de um desenvolvimento que se processa através de contrastes agudos. Por isso precisamos ser cuidadosos para não transferir a avaliação ética de bom e mau para novo nível, chamando o todo de bom e as partes de más. Onde existe ao menos um certo mal relativo não é na parte ser uma parte, mas na totalidade do todo abdicar para uma parte que afirma ser ou dominar o todo. Neste sentido, o mal é tornar-se aquilo que não se é, e o bem realizar aquilo que se ê. A lei da vida, a boa lei, é a lei do atendimento ao dharma, isto é, da completação daquilo que se é inerente e arquetipicamente.

E assim somos levados, em pensamento, de volta ao grande livro hindu, o Bhagavad Gita, que diz em seu terceiro capítulo:

Por isso execute você aquilo que precisa fazer, em todos os tempos sem pensar no evento, pois o homem que faz aquilo que deve fazer, sem apego ao resultado, obtém o Supremo ... É melhor cumprir seu próprio dever (dharma), mesmo que seja desprovido de excelência, do que cumprir bem o dever de outro. É melhor morrer no cumprimento do próprio dever, o dever do outro é cheio de perigos.

Tornar-se aquilo que se é, tornar-se a plenitude daquilo que se é, em outras palavras, viver o todo — mesmo que esta totalidade deva ser subsequentemente focalizada numa única tarefa, para cujo atendimento cada elemento do ser contribui por transferência deliberada e substituição psíquica — tal o ideal atemporal e universal do indivíduo. Significa a correlação perfeita de todos os valores dentro da personalidade, em seu caminho em direção à individuação. Significa a correlação perfeita dos fatores individuais e coletivos no criativo, em operação incessante. O coletivo provê os elementos substanciais, o individual provê a forma de organização, ou estrutura — que é a exteriorização da "qualidade" monádica, que por sua vez é a identidade espiritual do criativo. E desse acorde sempre-ativo e sempre-sonante de ser e de vir-a-ser — do vir-a-ser operando no e através do ser, do ser substancializado e operacionalizado no e através do vir-a-ser — emerge a totalidade criativa do todo orgânico.

A astrologia ilustra, exemplifica, provê aplicações para todas estas correlações. Mas ela também precisa ser compreendida inteira. Também precisa ser integrada em e através de uma abordagem estética que, só ela, pode revelar a totalidade de significado. Já vimos como esta correlação de ser e vira-ser pode ser percebida na e através da interação de carta de nascimento, progressões, direções e trânsitos. Aqui podemos mais uma vez apontar o engano, evidente em muito da prática astrológica atual, de se considerar carta de nascimento e progressões separadas umas das outras. Um aspecto entre planetas progredidos significa pouco, a não ser que se relacione com a carta de nascimento, seus planetas radicais e as casas em que o aspecto opera. Aspectos cotidianos são ainda menos significativos, 'a não ser que sejam vistos propriamente como "trânsitos" — isto é, relacionados com a carta de nascimento. Por toda parte, o gênio da astrologia será encontrado em correlações, agrupamentos, no equilíbrio de luzes contra sombras, de pretos contra brancos, de agentes formativos contra agentes destrutivos — aceitando todos eles como funções da totalidade orgânica do todo, sem discriminar nenhum — mas, não esqueçamos, aceitando cada elemento do ser como válido apenas quando tal aspecto está em seu lugar certo no momento certo.

Talvez uma analogia musical possa ajudar a evidenciar o que queremos dizer. Falamos da carta de nascimento como o "acorde do ser individual", e, ao menos por implicação e junto com nossa análise de tempo previamente estudada, como a partitura da sinfonia na qual ser e vir-a-ser se inter-relacionam com o propósito de uma totalidade cada vez mais plena e mais manifesta: O que o astrólogo deveria descobrir é a "tonalidade" do acorde e da sinfonia. É desta tonalidade que falamos, pouco antes, como "o relacionamento orgânico de relações entre partes". Só aquele que é capaz de descobrir esta totalidade individual de uma personalidade e de um destino pode ser chamado de verdadeiro astrólogo. Pois só assim ele pode provar que tem o poder de "percepção holística", que lhe revela a totalidade de qualquer todo.

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Extraído do livro Astrologia da Personalidade, de Dane Rudhyar.

quarta-feira, 17 de agosto de 2016

A "Construção do Templo" e o Ponto do Self, por Dane Rudhyar



Ao encerrarmos esta parte de nosso estudo, que lida com o fator de evolução do tempo na astrologia, queremos voltar ao assunto que mencionamos anteriormente, pois agora temos melhores condições de compreender. Abrimos nossa discussão sobre progressões e similares considerando aquilo que chamamos análise do tempo da carta de nascimento. Mas, um outro tipo de análise do tempo da carta de nascimento foi estudado em nosso capítulo "O mostrador de casas". Se voltamos a mencioná-la agora é porque, para nossa mente, esses dois tipos de análise do tempo se aprofundam mais na questão de determinar valores reais do "vir-a-ser" que quaisquer outros métodos mais usuais que acrescentem fatores planetários produzidos após o nascimento.

Todos esses métodos (progressões, direções, trânsitos) deixam de considerar o indivíduo como um todo, passível de perfeição. Eles quebram a singularidade, a qualidade única e a unidade da simbolização astrológica. Espalham o nascimento num período indefinido de minutos, dias ou anos, e mostram o homem iniciando ciclos de desenvolvimento que ele normalmente não pode completar no presente estado do destino humano. Mostram-no com as três partes de sua natureza desenvolvendo-se de acordo com ritmos que não combinam exatamente. É verdade que nisto reside liberdade — mas também não-completação.

No procedimento explicado no capítulo "O mostrador de casas", lidamos com completação cíclica. O homem é visto como capaz de completar a construção de seu templo de imortalidade no intervalo de 84 anos (três ciclos de 28 anos). Ele é visto como o experimentador de ciclos inteiros de experiência, através dos quais todos os seus planetas, e todos os seus relacionamentos mútuos de qualquer tipo concebível (partes do mapa, aspectos etc.), são sucessivamente energizados e expressados. Aqui, na verdade, temos uma visão positiva, construtiva do Homem, um Deus que está se fazendo; enquanto nas progressões, direções e trânsitos somos levados a testemunhar o espetáculo de um corredor largando numa corrida tripla que ele talvez não possa esperar terminar. Seu "Sol progredido" nunca completará a corrida zodiacal. Seu "Meio-do-Céu direcional" nunca conhecerá um dia completo de atividade. O Sol em transito nunca se porá sobre uma personalidade completada através das "370 voltas" da Grande Serpente da Eternidade, de que falam a Cabala e H. P. Blavatsky.

De que vale então nascer, se o indivíduo está fadado a ser derrotado pelo carma racial e não pode ter a esperança de atingir a meta de totalidade? Não existe nenhum homem que, dentro dos limites da nossa presente vida terrena, jamais atinja completação? Se a completação é possível para o indivíduo, a despeito do ambiente racial — se não como personalidade externa, ao menos como self individual —, então progressões, direções e trânsitos igualmente contam apenas uma parte da história do processo de vida. Eles podem lidar com o corpo terreno tangível e com a personalidade racial, mas há um campo que eles não consideram — o único, parece, no qual o indivíduo pode atingir a completação, e assim — a imortalidade.

A análise do tempo que apresentamos no último capítulo não tenta mapear a totalidade de nenhum ciclo de desenvolvimento. Não coloca limites determinados nem se refere a nenhum ciclo em particular. Simplesmente dá informações a respeito de certos momentos críticos no processo de elaboração real das implicações contidas na carta de nascimento. Mas tais momentos críticos teoricamente poderiam ser repetidos ad infinitum. Mesmo a equação "um grau é igual a um ano" não é um fator necessário nessa "análise do tempo". Pois, do modo como concebemos este método, trata-se apenas de uma questão de relacionamento abstrato entre 24 fatores fixos. O que ele realmente pretende mostrar não é o tempo exato de uma ocorrência, mas mais a sequência das operações envolvidas no processo de atualização das potencialidades mostradas na carta de nascimento. Em outras palavras, as operações de construção podem ser aceleradas, mas o telhado não será colocado antes que as paredes sejam construídas, nem estas serão construídas antes que o alicerce tenha sido construído. Portanto, o que a análise do tempo revela é a sequência de operações, e a equação um grau por ano é apenas um coeficiente que parece ser o mais próximo do correto no atual estágio da empreitada humana. Em algumas personalidades, um coeficiente mais rápido poderia ser mais eficaz; por exemplo: dois graus e meio por ano foi a equação sugerida por Carter (um doze avos de um signo zodiacal), e em muitos casos dá resultados muito significativos.

Quando detalhamos o método através do qual se poderia mapear o progresso do indivíduo por ciclos de 28 anos, também escrevemos que este era um modo de determinar a escala de operações na construção do templo do Homem. Mas, pela própria natureza deste tipo de análise de tempo da carta de nascimento, lidamos com ciclos fechados. Lidamos com limites de tempo muito definidos — arquetípicos — com relação a um período de vida. O que não foi feito quando deveria ter sido feito ficará perdido para sempre. Mas os termos feito e perdido não se referem tanto a um comportamento da personalidade quanto a percepções individuais. Temos aqui um desvendar das profundezas do ser, uma exploração solene do santuário da alma individual — do domínio do puro significado.

Isso fica particularmente evidente quando observamos o ciclo de progressões da Lua, que ocorre em mais de 27 anos, rigorosamente aproximando-se do ciclo de 28 anos do que chamamos de ponto do self; também o ciclo de trânsito de Saturno, que cobre um período um pouco mais longo. Enquanto a Lua progredida indica, na maior parte, fases do ser exterior, e Saturno em trânsito o lento aprofundamento ou cristalização do fator ego, o ponta do self refere-se a valores puramente internos, mas que esclarecem a mais secreta determinação do indivíduo, sua capacidade ou incapacidade de atribuir significado à vida.

Para terminar, permitam-nos alertar o estudante dos movimentos cíclicos do self, para que ele não esqueça de que este ponto, na verdade, não é um mero ponto, mas uma cruz. Os quatro ângulos da carta (os dois eixos do self individual, horizonte e meridiano) precisam ser vistos em rotação durante o ciclo de 28 anos. Ocorrem mudanças sutis de focalização, enfatizando em alguns casos o fator horizonte, em outros o fator meridiano. Só quando estes são cuidadosamente estudados, em função de indicações dadas pela carta de nascimento como um todo é que este método revela um quadro realmente válido, porque completo, da vida interior do indivíduo. Através dele podemos ver o padrão de completação individual em lento desdobramento, delineando-se suave ou vividamente contra o fundo das progressões e trânsitos mais óbvios e concretos. Aqui pode-se discernir o homem, um sucesso ou um fracasso — em termos não daquilo que ele faz, mas do significado e da beleza com que reveste cada incidente da vida em seu caminho em direção à divindade — ou à aniquilação.

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Extraído do livro Astrologia da Personalidade, de Dane Rudhyar.


terça-feira, 16 de agosto de 2016

Retificação da Carta de Nascimento, por Dane Rudhyar


Não podemos encerrar este capítulo sem mencionar, do modo mais breve possível, um assunto de importância suprema, que na verdade é o fator mais agravante em qualquer trabalho prático de astrologia. Este fator é a incerteza quase universal quanto ao momento exato em que a pessoa respirou pela primeira vez. Se o leitor nos acompanhou com compreensão através de nossa apresentação dos fundamentos da astrologia, ser-lhe-á evidente que todos os fatores de uma carta de nascimento que se refiram à rotação axial da Terra são absolutamente dependentes do momento estritamente exato de nascimento (primeira respiração). Pois uma diferença de quatro minutos de hora de nascimento muda os graus de todas as cúspides, de todas as Rodas astrológicas, e portanto altera todos os cálculos baseados em direções primárias.

É claro que isto significa que onde exista tal incerteza quanto ao momento de nascimento, deve existir na mesma proporção uma incerteza quanto aos fatores individuais na personalidade e no destino do nativo. Isto é de importância capital para qualquer tipo de interpretação que ressalte o fator simbólico dos graus e em geral para qualquer tipo de interpretação psicológica e criativa. Como um erro de quatro minutos no horário de nascimento é quase inevitável, considerando o modo acidental de registro do horário de nascimento por enfermeiras atendentes, e considerando a memória variável da mãe e parentes, o problema na verdade é dos mais sérios. De fato ele tende a tornar a grande maioria das interpretações astrológicas não-confiáveis de várias maneiras, especialmente quando a natureza interna e os fatores criativos espirituais nos processos de individuação são analisados.

Para evitar esta deficiência, o astrólogo pode recorrer a um procedimento chamado retificação. É uma tentativa de descobrir, através de um dos vários métodos em uso, o momento exato do nascimento. As várias bases desses métodos de retificação podem ser descritas, em geral, como segue:

1) Descobrir o signo ascendente pelas feições do nativo. Isto baseia-se no fato de que o Ascendente se refere à estrutura do ser individual — ou melhor, às suas feições. Estrutura, no sentido de estrutura óssea, é uma questão que depende mais de Saturno e da Lua. Mas "feições" referem-se não apenas à estrutura corpórea geral, mas, até mais que isso, à expressão geral do corpo, e especialmente do rosto. O signo solar dá mais a radiação vital da personalidade como um todo; Saturno e Lua, a moldura do corpo e o ritmo da vida de sentimentos, que em grande parte é condicionado por essa moldura física. O Ascendente refere-se à expressão do indivíduo através do corpo, ao fator único de ser, à maneira pela qual o indivíduo vive sua vida num contexto material. É por isso que as características do Ascendente em geral ficam mais evidentes após os 35 anos, pois então o indivíduo como tal tornou-se mais plenamente "in-corporado" e sua marca ou assinatura mais claramente visível.

Como são doze os tipos básicos de Ascendente, o astrólogo é capaz, olhando para o nativo, de determinar seu "signo ascendente" — teoricamente! Em termos práticos, uma caracterização como essa é sempre mais ou menos incerta, tão incerta quanto é difícil separar o fator ascendente de outros fatores que influenciam a aparência corpórea. Além disso, este método determina apenas a natureza do signo ascendente, que, como média, significa um período de duas horas durante o qual a pessoa pode ter nascido. No entanto este é um procedimento muito válido, a ser utilizado sempre que a pessoa não conheça nem mesmo a hora de seu nascimento.

2) Retificação através de eventos passados. O princípio deste procedimento é que, tal como é possível predizer eventos futuros a partir de um momento exato de nascimento conhecido, também é possível deduzir o momento exato de nascimento a partir de eventos passados precisamente conhecidos. Propriamente, isto é "retificar" uma hora de nascimento duvidosa a partir do conhecimento da história de vida do nativo. Obviamente, este procedimento é muito perigoso, exceto quando a incerteza quanto ao momento de nascimento estiver confinada a limites de tempo estreitos — digamos, quinze minutos ou meia hora. No entanto é muito mais fácil encontrar o aspecto astrológico correto, que é a expressão de um certo evento da vida, do que predizer um evento preciso como resultado de um aspecto que ainda está por se formar. Isto porque destino passado é vida cristalizada — vida menos a incerteza da liberdade humana.

Colocando isto em outros termos: numa vida não acontece nenhum evento ao qual não se possa relacionar simbolicamente um aspecto astrológico, dando àquele evento um significado adequado. Mas isto não implica que um aspecto definido sempre produzirá uma ocorrência definida. Um aspecto é necessário para que um evento ocorra, mas não é prova suficiente para predizer corretamente a ocorrência de um acontecimento definido. Um ponto importante que jamais deve ser esquecido!

A dificuldade é isolar aquela determinada ocorrência passada que verdadeiramente corresponda a (ou é indicada por) um certo aspecto que tenha amadurecido naquela determinada época. Um aspecto por progressão secundária e um aspecto por direção primária podem parecer referir-se, digamos, a uma viagem importante, mas eles determinam datas que diferem por um ou dois anos. O problema da retificação é: a partir de qual aspecto determinar o momento de nascimento? Pode parecer que dois ou mais aspectos por progressão secundária também possam ser tomados indiferentemente, como significadores de um evento definido. Se forem feitos cálculos regressivos a partir desses diversos aspectos, poderão ser encontradas diversas horas possíveis de nascimento.

Portanto retificação envolve uma série muito complexa de conferências e reconferências, de calcular para frente e para trás, o que significa — mesmo quando a vida do nativo apresenta pontos de mutação definidos (o melhor caso para o propósito de retificação) — gastar muito tempo e usar de muita engenhosidade. É absolutamente necessária uma sensibilidade psicológica real da vida humana e das reações humanas para que o astrólogo possa determinar qual aspecto é o símbolo mais provável de algum evento passado, e também a capacidade de obter do nativo informações que ele possa ter esquecido ou cuja importância não perceba. Esta capacidade não é tão frequente quanto possa parecer, e todo psicanalista conhece este fato muito bem. Na verdade, muito poucas pessoas percebem quais eventos de seu passado realmente foram significativos, e normalmente as pessoas não compreendem o verdadeiro significado desses eventos. O maior valor da astrologia provavelmente está em ajudar o homem a descobrir o significado daquilo que já aconteceu. Só quando cada fator de sua história aparece com um significado claro em termos de destino como um todo — só então o homem está realmente preparado para enfrentar seu futuro com inteligência e compreensão, em outras palavras, em função de seu verdadeiro estado de self individual.

Depois de considerar os fatores astrológicos mais importantes, mencionados como os mais reveladores para o propósito de retificação, acreditamos que aqueles que Marc Jones menciona em seu curso Directional Astrology provavelmente sejam os melhores; ao menos são, de longe, os mais simples. São:

1) A passagem da Lua progredida sobre os ângulos da carta de nascimento — permite determinar estes ângulos corretamente. A passagem sobre o ascendente é em quase todos os casos uma indicação de alguma mudança básica no destino ou na autocompreensão. Geralmente marca uma mudança de residência ou de ambiente significativa; no entanto, em muitos casos, uma mudança de "ambiente interno", uma nova abordagem da autocompreensão, são as únicas coisas reconhecíveis na vida — especialmente no caso de introvertidos típicos.

2) Os aspectos de Marte ou Saturno com o meridiano zênite, isto é, com o Meio-do-Céu ou o nadir, que muitas vezes se referem à morte de um dos pais. Tais aspectos podem ser calculados de acordo com o tipo mais simples de direções primárias, mas a nosso ver referem-se ao que chamamos de análise de tempo da carta de nascimento. A morte de um dos pais — especialmente a primeira morte — marca uma liberação psicológica definida do fator individual em quase todas as vidas. É uma ocorrência básica como esta que deveria ser notada na própria forma seminal do destino, nos projetos de estrutura de vida individual. Uma morte como essa normalmente é acompanhada de uma descarga de forças psíquicas ou anímicas de quem morreu para o nativo, e o significado disso normalmente é de suprema importância. No entanto há casos em que uma indiferença clara do nativo com relação aos pais leva a uma "morte psicológica" dos pais, e é a este evento que o aspecto acima se refere, mais que à própria morte física.

Os aspectos de morte a serem considerados são conjunção, quadratura e semiquadratura de Marte ou de Saturno com o Meio-do-Céu ou nadir. Se Marte está a dez graus do Meio-do-Céu, a morte de um dos pais pode ocorrer aos dez anos. Mas também pode ocorrer aos 35 (por semiquadratura). Repetimos: tais aspectos não indicam a necessidade de uma morte, mas se ocorreu uma morte aos dez anos, e Marte está a onze graus do Meio-do-Céu, então a conclusão lógica é que a posição do Meio-do-Céu não é correta e deveria ser deslocada de um grau, para fazer com que o arco entre Marte e o Meio-do-Céu seja igual a dez graus. É isto que se quer dizer com "retificar" uma carta.

3) Retificar pela época pré-natal ou pelo aniversário da mãe são dois métodos de importância desigual e muito diferentes em técnica. Eles são colocados em uma categoria, porque ambos são tentativas de definir o surgimento do fator individual num novo ciclo vital (primeira respiração) em função de sua linhagem materna. A ideia é que certos períodos que afetam a formação da substancia corpórea do ser através da mãe levam, de modo mensurável, ao início do período de existência individual.

Muito já se disse a favor e contra o levantamento de um mapa para o momento da concepção. Podemos apenas salientar que a concepção é um momento na vida da mãe e não na vida de uma pessoa individual que de nenhum modo pode ser chamada de indivíduo, até que tenha atuado como uma entidade independente e relativamente autossustentada, ou seja, até que tenha respirado. Num certo sentido, a concepção não é mais importante para a vida do futuro indivíduo que o momento em que seus pais se conheceram. Pertence ao ciclo anterior a seu próprio ciclo individual. E o último de uma série de eventos, que se estende ao início do sistema solar, que condiciona aquilo de onde emerge o indivíduo. E o resumo da hereditariedade. Mas hereditariedade é simplesmente um dos aspectos básicos do fator coletivo da existência; o outro aspecto é o meio ambiente. Ele não determina o fator individual. Condiciona apenas aquilo através de que este fator individual precisará expressar-se.

No cálculo da carta da "época pré-natal" (que, aliás, não parece referir-se ao momento exato e real da concepção fisiológica), estabelece-se uma relação entre o Ascendente no nascimento e a Lua no momento aproximado de concepção. Isto para dizer, simbolicamente, que existe um momento na vida da mãe, por volta do período da concepção, em que ela prevê, em sua imaginação criativa, o que será o self individual de sua futura criança.

Poderíamos concluir dizendo, como já dissemos antes, que a razão pela qual é tão difícil precisar exatamente as cúspides das casas e todos os elementos referentes à rotação axial da Terra é que eles simbolizam o verdadeiro fator individual no homem. E este fator individual realmente é sagrado. Portanto, é bom que ele fique longe da análise dos indiscretos e dos curiosos. O grau exato do Ascendente é a chave para a qualidade singular do ser e do destino do homem. Num mundo em que o indivíduo é desdenhado e tantas vezes crucificado pela estupidez coletiva, talvez devêssemos nos alegrar com o fato de o Ascendente e todas as cúspides, que são os portais para o self criativo mais interno do homem e para a sua liberdade criativa, normalmente ficarem envoltos em mistério.


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Extraído do livro Astrologia da Personalidade, de Dane Rudhyar.


segunda-feira, 15 de agosto de 2016

Trânsitos, por Dane Rudhyar



De acordo com os conceitos formulados em nosso capítulo anterior, os trânsitos não diferem fundamentalmente de progressões ou direções. Eles são constituídos pelo movimento planetário ao longo do ciclo de 370 anos de completação da personalidade. Neste movimento, um dia de progressão corresponde a um dia de vida, um ano a um ano. No mais eles devem ser tratados exatamente como as progressões secundárias. Os aspectos podem ser calculados "progredido a progredido" ou "progredido a radical". Aqui "progredido" significa a posição real dos planetas como se vê na efeméride do ano de vida considerado. O ponto a ser lembrado é sempre o de que tais posições e os aspectos formados se referem ao âmbito da personalidade, isto é, àquela síntese de comportamento, sentimentos e pensamentos manifestados, que é o "homem concreto", o homem tentando tomar real e demonstrar num organismo terrestre (fisiológico e psicológico) a totalidade de seu ser.

Um exemplo elucidará este ponto completamente. Tomemos mais uma vez o mapa de Mussolini. Ele nasceu em 29 de julho de 1883. Consideremos agora as condições de "trânsitos" para a época da "marcha sobre Roma", isto é, 39 anos e 3 meses após seu nascimento: 30 de outubro de 1922. Procuramos esta data na efeméride e anotamos as posições dos planetas (por longitude). Essas posições nos dão as posições dos planetas "em trânsito'.

Se, por outro lado, desejássemos as "posições progredidas" para aquela mesma data, deveríamos ter consultado a efeméride para o dia 6 de setembro de 1833 (isto é, 39 dias e 6 horas após o nascimento). E se tivéssemos procurado as posições de "direções primárias" para esta "marcha sobre Roma", deveríamos ter considerado o estado da rotação da Terra 157 minutos (isto é, 39 vezes 4 minutos, mais 1 minuto) após o momento exato da primeira respiração de Mussolini. O mesmo processo é usado nos três casos, exceto que, nas "direções primárias", os fatores considerados são de natureza um tanto diferente, e assim sua consideração requer cálculos mais complicados.

Voltando agora às posições "em trânsito' para a "marcha sobre Roma", descobrimos que, tal como na interpretação de progressões secundárias, há dois métodos possíveis. O primeiro consiste em estudar os aspectos "trânsito . a trânsito"; o segundo, consiste em analisar os aspectos formados entre posições em trânsito e as posições radicais. O primeiro método se refere, obviamente, aos fatores mais transitórios da situação, ao simples fluxo de circunstâncias, sem ter nenhuma relação específica com Mussolini como indivíduo, mas caracterizando as condições dos sentimentos e disposições gerais de tudo na superfície da Terra naquele dia.

Vemos agora que no dia 30 de outubro de 1922 a Lua estava em conjunção com Urano, pouco antes do meio-dia, no décimo grau de Peixes; que Netuno em Leão estava em sextil com Mercúrio e Saturno em Libra; Júpiter numa conjunção distante com o Sol em Escorpião; Marte em trígono com o Nodo Norte e aproximando-se de uma quadratura com Júpiter. Como um todo, a configuração era muito favorável para regeneração pública e demonstração de poder. O símbolo do Sol naquele dia era "Mergulhadores de águas profundas", indicando um atirar-se destemidamente na experiência ou, corno Marc Jones o interpreta, "aventurar-se propositadamente". A conjunção Lua-Urano ocorreu no grau simbolizado por "Um aviador em voo de altitude elevada, mestre dos céus", interpretado como indicação de "transcendência dos problemas normais a ponto de obter responsabilidades celestiais" e a "coroação" de empreitadas humanas. Na verdade, tudo isto é realmente muito significativo!

Mas isso não se refere a Mussolini como indivíduo, mas apenas à qualidade dos eventos naquele dia. Para ver como essas "posições planetárias" se referem a Mussolini como indivíduo, precisamos compará-las com sua carta de nascimento radical, a forma-seminal de seu destino. Um traço aparece imediatamente, vividamente: o "Sol em trânsito' estava em conjunção exata com o Nodo Norte de Mussolini no final do dia. No final do dia, ele chegou a Roma, intimado pelo rei a assumir poder total. Em outras palavras, como o Nodo Norte é um ponto de destino futuro e influxo de poder, 30 de outubro era o dia do ano em que o "Sol em trânsito" o vitalizaria e o faria operar com o máximo de poder — com referência à personalidade de Mussolini. Obviamente, num evento como este o que estava em jogo mais que qualquer outra coisa era o poder da personalidade.

Ao mesmo tempo a conjunção em trânsito Lua-Urano ocorreu na "casa quatro" de Mussolini — urna mudança de domicilio e identidade concreta — em oposição à sua Parte da Fortuna radical uma consciência (oposição) de responsabilidade pública (décima casa), num certo sentido se opondo à sua felicidade pessoal (Parte da Fortuna). Esta conjunção estava em quadratura com sua conjunção radical Saturno-Lua-Marte, atingindo a Lua por quadratura e indicando a incorporação (quadratura) de um destino público (Lua). Netuno em transito estava muito próximo do Meio-do-Céu em Leão, mostrando que o poder da coletividade racial estava sendo focalizado sobre o ponto de atividade pública e poder espiritual de Mussolini. Finalmente, o Nodo Norte em trânsito estava sobre a cúspide da "décima primeira" casa, prestes a entrar na casa da atividade pública por retrogradação natural — indicando o poder de amigos e associados numa causa comum. Poderíamos ainda acrescentar que Mercúrio e Saturno em trânsito estavam em sua "terceira casa", perto de uma oposição a seu Júpiter e seu Vênus radicais. Esta foi uma influência limitadora muito valiosa, trazendo bom senso, moderação e atenção a objetivos próximos (terceira casa) — como equilibradores para planos distantes e grandiosos (nona casa). A conjunção Júpiter-Vênus na "nona casa" de Mussolini é um perigo para ele, e isto pode ficar particularmente evidente num futuro próximo, quando seu "Marte progredido" estiver adicionando combustível a uma configuração superexpansiva e imperialista.

Esta referência a um planeta progredido nos leva a indicar que, no momento de sua marcha sobre Roma, a "Lua progredida" de Mussolini estava aproximadamente cruzando seu ascendente radical — a mais forte das indicações para uma mudança significativa de arredores e uma repolarização igualmente importante da vida pessoal externa. O aspecto mais importante por "direção primária" é a conjunção de Marte com Júpiter, que mostra expansão — desta vez relacionada com o fator individual. Assim, um aumento de segurança individual e autoridade, uma mobilização de energias da alma para ação expansiva.

Estudar detalhadamente toda a complexa configuração de progressões, direções e trânsitos para este evento extremamente importante da vida de Mussolini está muito além do escopo deste livro, mas acreditamos que o que foi dito seja suficiente para indicar o procedimento geral e mostrar como esses três métodos básicos podem ser operados em relação mútua.
Trânsitos podem ser trabalhados de diversas maneiras, mas alguns pontos sempre precisam ser considerados quando se relacionam planetas em trânsito com a carta de nascimento.

Primeiramente, planetas rápidos, como Mercúrio, Marte e Vênus, fazem tantos aspectos com planetas radicais e com tamanha freqüência, que a importância desses aspectos é muito pequena. Nestes casos a passagem do planeta em trânsito por uma casa geralmente é o fator mais valioso de determinação, especialmente quando qualquer planeta em trânsito cruza os "ângulos" do mapa radical, aumentando temporariamente na vida da personalidade a função simbolizada por cada um dos ângulos, em termos do tipo de atividade representada pelo planeta.

Os padrões formados pelos planetas lentos (Urano, Netuno e Plutão), no entanto, são de grande importância, pois pelos aspectos que estes planetas formam com os planetas radicais (e por sua passagem pelas casas radicais) é que se pode mapear precisamente a influência de grupos humanos e da sociedade humana em geral sobre o desenvolvimento da personalidade. Trânsitos de Urano liberam o caráter (ou a "loucura") do indivíduo e o tornam socialmente efetivo.

Trânsitos de Netuno, ao contrário, referem-se à pressão de fatores coletivos ou grupais sobre o indivíduo, lutando por seu direito de ser um indivíduo. Trânsitos de Plutão (quando efetivos) fazem surgir o chamado de uma nova ordem para a personalidade. Eles forçam a personalidade a alinhar-se com novos ideais e novas formas sociais. Eles podem causar mortes que afetam o destino na esfera da personalidade, e também associações que afetam o destino.

Os trânsitos de Júpiter e Saturno se referem mais especialmente ao modo como o ego do homem funciona exteriormente; a fases inibitivas e formatórias de desenvolvimento, no caso de Saturno; a tipos expansivos e compensatórios de liberação de alma, no caso de Júpiter. O ciclo de 29 anos de Saturno e o ciclo de 12 anos de Júpiter são fatores importantes no processo de vida, especialmente e relação ao que poderia ser chamado de fator alma.

A influência de planetas em trânsito é muito enfatizada quando uma conjunção ou oposição entre eles atinge um ponto importante do mapa radical. Assim, cada lunação (conjunção — e oposição — de Sol e Lua) tem significado para a personalidade se ocorre num aspecto forte, com um planeta radical forte (ou ângulo). Este significado é muito ampliado no caso de eclipses. Por exemplo: o eclipse de 29 de julho de 1935 sobre o Sol de Mussolini poderá demonstrar um significado assustador. Um aglomerado de planetas transitando por um ponto radical, naturalmente, é de importância ainda maior.

Um outro modo muito valioso de usar trânsitos é encontrado no cálculo de mapas de aniversário. Este mapa é calculado para cada dia de aniversário e mostra, de um modo geralmente muito preciso, que tipo de eventos de personalidade devem ser esperados naquele ano da vida do nativo em particular (ou seja, de aniversário a aniversário). Mas aqui novamente temos pelo menos dois métodos básicos de levantar este mapa:

1) o mapa de aniversário é calculado pela hora original de nascimento no local de residência (não no local de nascimento);

2) o mapa de aniversário é calculado para o momento em que o "Sol em trânsito" retorna à posição zodiacal exata que ocupava por ocasião do nascimento. Este momento pode não cair no mesmo dia do nascimento. Por isto, em vez de ser chamado mapa de aniversário este mapa é chamado mapa da revolução solar. Pode ser calculado tanto para a latitude do lugar de nascimento quanto para a do lugar de residência. O primeiro é preferível, pois este tipo de mapa é definidamente correlato à carta de nascimento pela identidade de fatores solares — portanto também à latitude de nascimento.

Nos dois casos, o padrão de casas geralmente é diferente da carta natal, exceto, no primeiro caso, se o nativo mora no local em que nasceu. Se desejarmos manter o padrão de casas do nascimento, então o mapa de aniversário precisa ser calculado para o lugar de nascimento; em outras palavras, as posições de trânsito dos planetas são marcas na estrutura radical de casas. Este é o modo comum de cálculo de trânsitos.

Vimos assim rapidamente como os vários tipos de progressões, direções e trânsitos operam. Se formos cuidadosos e mantivermos sempre a visão do quadro todo que estes sistemas formam, e se tivermos entendido perfeitamente a divisão psicológica do ser humano como um todo em fatores individuais, coletivos e de personalidade, não deveríamos ter nenhuma dificuldade em dominar uma situação complexa. O ponto principal que queremos enfatizar — e que acreditamos nunca ter sido enfatizado deste modo antes — é que não existe nenhuma diferença básica entre progressões, direções e trânsitos. Nestes três sistemas, estabelecemos uma correspondência entre unidades de três ciclos: o ciclo-dia (fator individual), o ciclo-ano (fator coletivo) e o ciclo-370 anos (fator personalidade), e lemos o estado real dos céus após o nascimento em termos dessas unidades cíclicas, equacionando-as de qualquer modo que desejarmos.

Estas leituras de posições pós-natais, na maioria dos casos devem ter como referência a carta de nascimento, pois ela representa a forma-seminal de ser e porque o "vir-a-ser" não pode ter significado exceto em termos de "ser". Valores puros do "vir-a-ser" podem ser determinados de modo útil em muitos casos, como nos aspectos planetários "progredido a progredido" e "em trânsito a trânsito'. Mas com isso se obtém, no caso das progressões, apenas informações relacionadas com o fluxo do "devir da personalidade" e,. no caso dos trânsitos, apenas informações sobre as condições do meio ambiente em geral. Como nossa preocupação principal é com o processo segundo o qual o indivíduo, após sucessiva assimilação de valores coletivos, alcança sua completação como personalidade criativa, é evidente que só podemos atribuir significado a este processo remetendo todos os fatores do "vir-a-ser" à forma-seminal do "ser" individual.

A grande dificuldade para se trabalhar com diversos sistemas de computação de tempo é que o tempo de maturação de um mesmo aspecto é diferente em cada sistema. Portanto se tentarmos prognosticar eventos, na verdade é muito difícil saber qual indicação de tempo escolher para o evento. As vezes, analisando a importância básica do evento considerado, pode-se saber se tende mais a cair nas indicações dadas pelo sistema de fatores individuais do que nas dos sistemas de fatores coletivos etc. Mas, esta é sempre uma questão incerta.

O que importa é que nenhum evento pode ser previsto com precisão pela astrologia natal. Previsões de futuro do tipo psíquico e, numa medida bastante considerável, a "astrologia horária" de um certo modo podem produzir evidências melhores de rigor de previsibilidade. Talvez elas localizem melhor os eventos, mas não podem atribuir significado ao processo vital do qual esses eventos são meros indicadores externos. Encontramos aqui novamente um tipo psicológico de "principio de indeterminância" em funcionamento. Normalmente, ninguém pode precisar o local de um evento e o seu significado ao mesmo tempo. Cada fator requer um tipo especial de polarização mental ou espiritual, que, ao menos até certo ponto, exclui a outra.

Além do mais, por que eventos deveriam ser previstos com precisão? O coeficiente de imprecisão é o coeficiente de liberdade. De um ponto de vista estritamente astrológico, este último é encarado como sendo o próprio fato, de existirem vários modos possíveis de progredir, direcionar ou "transitar" um mapa. Este fato refere-se à constituição tríplice básica do homem: o principio mental (individual), o principio de sentimentos (coletivo) e o princípio de comportamento (personalidade). Pensamentos, sentimentos e ações têm cada qual uma existência quase independente no homem — como a filosofia oculta demonstrou desde (ou antes de) Platão. A liberdade reside na inter-relação criativa destes três fatores.

Portanto o fator criativo em progressões e similares é o próprio elemento de imprecisão — o desespero dos astrólogos! Liberdade, como já vimos em relação à nossa análise de "cúspides" , o elemento "neutro" na vida. Entre o plano arquetípico e o campo do comportamento real existe um mundo ilusório misterioso, que é o mundo da psique humana (o tão mal entendido domínio kama-manasico dos teosofistas, o domínio Sukshma do filósofo hindu). É o mundo de liberdade e de ilusão, o mundo de criatividade e de engano, o mundo em que as realidades arquetípicas não são vistas como são, mas embaçadas pelo movimento do evoluir tal como uma paisagem é vista embaçada através das janelas fechadas de um trem em movimento, especialmente se o movimento causar enjôos ao viajante! E o mundo da personalidade; o mundo da relatividade — do qual o filósofo hindu tanto deseja ver-se desvencilhado. Mas o que é desvencilhamento?

Para nós, mera ilusão, a não ser que signifique antes de tudo completação. Liberdade só se conquista através da completação. E ser livre sempre significa um pouco de não conhecer, é o coeficiente de imprecisão. Ele se baseia na coragem de prosseguir desconhecendo o futuro.
É por isto que professores espirituais ou "mestres" — sejam o que forem — nunca obrigam, nunca mostram o futuro exato de qualquer ação empreendida. Pois fazer isto seria roubar a liberdade criativa do homem e sua iniciativa para criar. O que o homem pode fazer é compreender de tal modo seu passado, captar de tal maneira o significado completo da forma-seminal de seu ser e destino (carta de nascimento), que ele esteja totalmente preparado para ir de encontro a qualquer futuro — para encontrar-se com ele de modo significativo, com coragem, com compreensão, e a partir de uma concepção tão "bem estruturada", que todos os eventos sejam vistos como belos. Esta é a vida criativa e radiante de completação.

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Extraído do livro Astrologia da Personalidade, de Dane Rudhyar.


domingo, 14 de agosto de 2016

Direções Radicais, por Dane Rudhyar


Para simplificar o primeiro tipo de direção primária e facilitar sua determinação com o uso de uma efeméride astrológica comum, foi criado um sistema de direções (por Sepharial e, mais tarde, por Vivian Robson) chamado Sistema Radical. Nele, os "arcos de direções" entre planetas são calculados sobre a eclíptica (isto é, em termos de longitude) em vez de sobre o equador (isto é, em termos de Ascensão Direta). Se no nascimento o Sol está em 10° de Aries e Vênus em 29° de Aries, o arco de direção entre estes planetas é 19°.

De acordo com Sepharial e com a maioria dos astrólogos que utilizam este que é o mais simples dos sistemas, um ano de vida não é calculado como correspondendo a um grau, mas a 59' 8" — que é o movimento diário do Sol (o resultado da divisão de 365 e 1/4 dias solares por 360 graus). Num sistema como este, todos os pontos da carta natal, planetas e cúspides, são deslocados a essa razão de 59' 8" por ano, e o relacionamento entre estas posições sucessivas (anuais e mensais) e as posições radicais é analisado em termos de aspectos.

Este coeficiente de direção não é o único a ser considerado. Assim como o movimento médio diário do Sol fornece ao astrólogo um coeficiente de direção, também o movimento médio diário da Lua (13° 10') é usado para o mesmo propósito, um ano de vida correspondendo a um avanço direcional de 13° 10'. Este último procedimento é chamado direções menores enquanto o anterior recebe o nome de direções maiores, sendo as menores sempre submetidas às maiores, que dão as informações mais básicas.

Assim, se considerarmos a distância na carta de nascimento entre Sol e Vênus (19°), veremos que esse arco pode ser interpretado como originando uma conjunção Sol-Vênus, primeiramente, aos 19 anos e 1/3 (direções maiores) e também, secundariamente, aos 18 meses, aos 28 anos e dois meses, aos 56 anos e um mês, aos 83 anos e cinco meses (direções menores). Uma tábua de equivalência exata entre arcos e períodos é dada no final do livro de Vivian Robson, The Radix System, que detalha a técnica destas direções.

Exteriormente, este sistema está muito próximo do método de análise do tempo estudada anteriormente, mas o uso do movimento diário solar e lunar lhe dá um sabor de "progressões secundárias". Na verdade, parece existir pouca razão para adotar tais coeficientes de tradução de valores espaciais para temporais, pois dever-se-ia considerar ou o movimento diário real do Sol e da Lua ou o valor arquetípico de um grau. O Sistema Radical é obviamente uma acomodação que visa facilitar o cálculo e a simplificar. Mas, uma vez que o princípio de análise de tempo da carta de nascimento tenha sido plenamente entendido, parece ser um fundamento muito mais válido para chegar às fases básicas de operação do destino essencial do indivíduo.

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Extraído do livro Astrologia da Personalidade, de Dane Rudhyar.