O relacionamento Marte/Sol na carta pode ser expresso de modo semelhante, dizendo-se ou que é uma relação de 52° 51' de arco ou uma relação de um período de 52 anos e cerca de 10 meses. Em termos de aspecto, o relacionamento se equilibra entre uma semiquadratura mais 8 graus e um sextil menos 7 graus. Isto significa que "o destino está na balança", para Mussolini, em junho de 1936? Outras indicações poderiam corroborar a possibilidade de aquele ser um mês de expansão (Sol na nona casa) e viagens envolvendo agressividade e perigo. Mas como Marte e Sol são os dois assim chamados regentes da carta (um assunto cujo significado discutiremos logo adiante), há chance de o relacionamento se realizar sob forma de um extremo aumento de poder, apesar de ser indubitavelmente uma chance perigosa, considerando o fato de um eclipse ter caído sobre o Sol em 29 de julho de 1935, uma indicação de "trânsito". De qualquer modo, marcará um ponto de mutação no destino de Mussolini.
O arco entre Saturno e Júpiter tem 41°. A idade de 41 anos foi uma época crítica para Mussolini, como resultado do assassinato Matteotti, em que havia fascistas importantes envolvidos. Mas ele atravessou a tempestade levantada pela oposição, talvez porque, no nascimento, Saturno estivesse em sextil com o Sol, assim, o que poderia ter sido sua desgraça, fortaleceu sua posição.
Estando os planetas de Mussolini concentrados mais ou menos na mesma região do mapa, isso possibilita seu inter-relacionamento mútuo por esse método de "análise de tempo". Isto indica que o todo da natureza será atraído para fora sob forma de operação real e positiva. Em vez de calcular os arcos que separam os planetas, poderia ser calculado o arco que separa um planeta do ponto de aspecto de oposição a outro planeta. O tempo revelado dessa maneira mostraria uma ligação dos dois planetas, não em termos de atividade (aspecto de conjunção) como anteriormente, mas em termos de consciência (aspecto de oposição). Na carta de Mussolini isto provavelmente poderia ocorrer somente entre Netuno e Urano aos 60 anos. Isto marcaria — se ele atingir essa idade — um momento de grande realização do significado fundamental e espiritual de sua missão e destino — não em termos de algo a ser feito, mas do sentido de algo que foi feito.
Também se pode tentar a ligação através de quadraturas, trígonos, sextis. Por exemplo: Sol e Mercúrio de Mussolini estão a 32° 51' e 33° 20' de uma quadratura com a Lua (a 8° 50' de Virgem). Isto resulta em valores de tempo de cerca de 33 anos e 33 anos e meio. Ele foi seriamente ferido na guerra aos 33 anos e 6 meses.
Exemplos suficientes para dar uma ideia do processo seguido. Falta no entanto explicarmos por que a operação de tradução dos valores de espaço em valores de tempo foi baseada na equivalência de graus de arcos zodiacais e anos de vida. Esta questão tão discutida será abordada de um outro ângulo quando estudarmos a teoria das progressões e direções; mas agora podemos dizer que o grau é o ponto de partida mais conveniente para essa tradução de valores de espaço em valores de tempo pois, afinal, ele é a unidade de medida zodiacal e toda a trama do simbolismo astrológico repousa mais ou menos sobre o grau.
Como já dissemos, o grau é, por assim dizer, uma tradução do valor de tempo em valor de espaço, pois ele teoricamente é o espaço orbital que a Terra cobre durante o período de tempo que leva para perfazer um giro completo sobre seu eixo, isto é, um dia (sideral). Assim, o grau é um dia, em termos de medida espacial ao longo da órbita terrestre. Do dia, passamos agora para um ano dizendo: um dia é igual a um ano — e assim um grau é igual a um ano. Marc Jones coloca este assunto com muita habilidade em seu curso Directional Astrology, que citamos:
A teoria ... é que movimento sobre um circulo de movimentação celeste tem afinidade com o movimento em qualquer outro círculo correlato do mesmo esquema, e que a expressão deste relacionamento em qualquer um dos círculos cria naquele círculo uma entidade que corresponde ao círculo todo em termos de unidades. Assim, como há dois círculos celestes usados para a medida da movimentação dos planetas ... os círculos em que são medidos os movimentos diário e anual da Terra, diz-se, de princípio, que um dia corresponde a um ano; e isto é uma correspondência familiar ao simbolismo de qualquer tipo (como um ano tornar-se um dia aos olhos de Deus). Isto significa que um grau do círculo num caso corresponde d totalidade do outro ... e a partir deste fato, por extensão, os graus sobre qualquer um dos círculos correspondem a um ano de vida.
O que complica as coisas no que se refere a progressões e direções é o fato de haver "mais dias que graus" e que na verdade um dia não corresponde a um grau e sim a 59' 8". Discutimos este assunto no capítulo a respeito dos graus do zodíaco e afirmamos que o grau, considerado símbolo de uma liberação fundamental de significado criativo, é um valor arquetípico, e que a discrepância entre os 365 ou 366 dias e os 360 graus é uma expressão do "coeficiente de indeterminância" fundamental que domina, de um modo ou de outro, qualquer tentativa de traduzir fatores que pertençam a um nível ou esfera de vida em fatores que pertençam a outro nível ou esfera.
Ao lidar com fatos fenomênicos e eventos concretos — como o faz o astrólogo comum, que usa direções ou progressões —, há uma justificativa real para o uso do mutável valor de espaço coberto pelo Sol em um dia (ele varia de 0° 57' a 1° 1') porque, como veremos, a ideia por trás destes métodos é que nascimento é um evento progressivo. Mas, no caso da "análise de tempo de tuna carta natal" o fato do nascimento (ou melhor, do início da existência independente com a primeira respiração) é tido como totalmente suficiente e definido. A carta de nascimento é a "forma seminal" da existência como self individual. Por isso é considerada estritamente um padrão arquetípico, que é imutável e totalmente contido em si mesmo. Refere-se ao "ser", não ao "vir-a-ser". Portanto, todos os seus valores e todas as operações analíticas com ela relacionadas deveriam ser considerados a partir do nível arquetípico. Então, o grau deve ser usado para análise do tempo, porque é um valor arquetípico permanente, e não o fator instável do deslocamento diário do Sol — ou qualquer valor desse tipo —, que pertencem ao mundo dos fenômenos.
Agora o leitor pode perguntar: se a carta de nascimento não se refere ao "vir-a-ser", qual é então o significado da análise-tempo? Aqui nos defrontamos mais uma vez com um problema um tanto metafísico. No entanto ele pode ser esclarecido remetendo-nos mais uma vez à ilustração da construção de um templo. A carta de nascimento é o "projeto" que dá a forma seminal do templo. Qualquer arquiteto, olhando para este projeto, saberá sem nenhuma dúvida que, se o templo realmente for construído, as fundações primeiro precisarão ser escavadas, uma certa classe de operários precisará ser contratada primeiro, depois outra; que um certo tipo de material deverá ser fornecido logo no início das operações, outro mais tarde. Se ele conhece a condição exata do mundo dos negócios, será até mesmo capaz de dar uma data aproximada para a completação do edifício.
Ele conhecerá todas essas coisas simplesmente por analisar os projetos e estudar os pré-requisitos para a implantação da estrutura, que ele vê como potencialidade. Ele pode não conhecer essas coisas com grande exatidão, é claro, pois muito dependerá da habilidade dos materiais humanos empregados (engenheiros, mestres, operários) e das condições sociais gerais, que podem afetar seriamente as operações de construção. Mas saberá o suficiente para obter um quadro bastante preciso dos vários estágios de operações e do tempo de duração de cada estágio.
Isso é exatamente o que queremos dizer com "análise do tempo" da carta de nascimento. Ela não trata do "real vir-a-ser" (ou daquilo que Bergson chama duração), porque meramente espalha as potencialidades-semente numa escala de trabalho, o que faz com que o processo possa ser relacionado com "tempo matemático", mas não com "duração criativa". Na realidade, uma "duração criativa" desse tipo é essencialmente imprevisível. Cada momento é novo e brota de um oceano de potencialidades infinitas, sob forma de realidades que não podem ser preditas.
Então, o que o astrólogo deve fazer? Tudo que ele pode fazer é lidar com probabilidades e médias estatísticas, no que se refere a prognósticos. Ele observa o processo futuro desconhecido a partir de tantos ângulos, que sobrará muito pouco espaço para o incognoscível criativo. Mas somar todas essas observações prováveis será uma tarefa prodigiosa, e mesmo que os eventos reais sejam prognosticados corretamente, sempre permanecerá um valor misterioso imprevisível: o valor de significado. Supondo que alguém conheça cada passo do destino futuro de um indivíduo, que significado o indivíduo terá extraído de sua vida inteira ao se aproximar da morte? Ninguém pode dizer. Nem mesmo Deus pode saber. Pois Deus é feito de tais "somatórias de significado". Este é o vir-a-ser de Deus — duração pura e criativa: o Mistério insondável que é a Vida em si.
Tudo que a nossa análise de tempo pode fazer é ver as marcas da estrada que leva à completação da personalidade. Em alguns casos de grande importância no destino do indivíduo — como o caso da marcha sobre Roma na vida de Mussolini —, as marcas mostram uma ocorrência definida, que por si, objetivamente, é um ponto crucial de mutação. Mas estes casos não são muitos, e por que deveriam ser? Em outros casos, outros tipos de fatores, que servem para determinar o "processo vital" todo, podem ser mais potentes para precipitar eventos reais. Os fatores produzidos pela análise do tempo da carta natal (e esta análise é susceptível de desenvolvimentos muito mais complexos que os que foram indicados neste breve espaço) referem-se ao Destino arquetípico, àquilo que- é self individual em operação: o todo em ação. Eles lidam com a manifestação auto-inerente de existência potencial. Estes fatores são os mais abstratos, mas os mais poderosos numa vida dominada pela forma-seminal do self individual.
Antes de passarmos a investigar as progressões e direções propriamente ditas, é preciso salientar mais um ponto. Esta questão nos vem à mente pelo fato de alguns astrólogos ingleses estarem usando este método de análise-tempo, de várias maneiras, sob o nome de direções "simbólicas". Esta qualificação simbólica leva à má compreensão, pois tende a nos fazer acreditar que as progressões e direções usuais não são simbólicas. Este é um erro grave. Todas as progressões e direções são puramente simbólicas, e este fato deveria ser bem entendido, pois é por ele que a teoria das influências planetárias se quebra totalmente — quando o termo influência é usado com o significado de emanação de raios ou ondas que atuam física ou psicologicamente sobre um determinado indivíduo.
Cada palavra desta última sentença deveria ser considerada cuidadosamente, e não devemos chegar a nenhuma conclusão errada ou prematura. Todas as direções e progressões são simbólicas porque a equivalência de um ano a um dia ou a um período de quatro minutos (nas direções primárias) é puramente simbólica. E difícil entender por que alguém deixaria de reconhecer a verdade dessa asserção. É verdade que podemos dizer que o homem individual (o microcosmos) é uma imagem ou correspondência do sistema solar (o macrocosmos), e que os ciclos de movimentação em um causam respostas análogas no outro. Mas se é que uma afirmação como esta tem algum significado, este é que o sistema solar é visto como um símbolo do homem individual, e que as movimentações cíclicas dos corpos celestes ao redor da Terra correspondem a processos cíclicos da força vital em qualquer organismo vivo na Terra. Obviamente não há diferença entre dizer "correspondem a" ou "são símbolos de". Se alguém vê alguma diferença entre essas duas frases, isso é prova de que ou ele não entendeu a realidade vital dos símbolos — especialmente de símbolos coletivamente válidos, como as "imagens primordiais" ou "arquétipos" de que fala Jung —, ou usa o termo.correspondência sem entender o verdadeiro significado desse termo, tantas vezes utilizado tão superficialmente por estudantes de filosofia oculta.
Todas as progressões e direções são simbólicas, e é por isto que qualquer sistema "funciona" tão bem para o astrólogo que se identifica com ele (que acredita plenamente nele), e não tão bem para aquele que não está habituado com a "sensação' do sistema que usa. Na prática da medicina, igualmente, um remédio cura muito mais rapidamente um paciente que tem "fé" nele do que alguém que o toma com reservas e com "fé" quero dizer não uma mera convicção consciente de que o remédio curará, porém, mais exatamente, um anseio inconsciente de ser curado que se liga à medicação como a um símbolo de salvação. O mesmo é válido com relação à cura espiritual, conversão religiosa e todos os casos de "metamorfose de vida" profunda. Elas ocorrem porque os poderes profundos da vida interior (chame-a inconsciente ou do que quiser!) se concentraram em tomo de um "símbolo", uma imagem de salvação ou de auto-renovação. Não uma ideia abstrata, entendamos bem, mas uma imagem sensorial evidente, concreta, visualizável. Daí a validade da ideia do "Deus pessoal", ou do guru ou de "professores espirituais" — todas imagens e símbolos de totalidade operativa, isto é, de cura e salvação.
Problemas surgem quando o símbolo é tomado por uma realidade material, porque então a pessoa começa a acreditar que uma entidade exterior a está influenciando a partir de alguma base externa tangível. "Saturno está me crucificando!", clama o devoto da astrologia. "Um mago negro está me perseguindo!", soluça o suposto ocultista apavorado. E o medo se instala e desintegra a personalidade. Nem Saturno nem o mago negro têm qualquer significado para qualquer pessoa, exceto como um símbolo de uma fase de processo de vida, através da qual todo ser humano precisa passar, neste ou naquele nível de existência.
Em outras palavras, a assustadora "quadratura de Saturno e Sol" ou o assustador "mago negro" são acontecimentos que têm realidade dentro da esfera da personalidade. É por isto que os bons livros de ocultismo dizem que o "senhor negro" não está encarnado, mas funciona no plano mental. Isto é um modo de dizer — de acordo com a terminologia peculiar da filosofia oculta — que um Poder nefasto como este é um símbolo (ou arquétipo) que, em certos períodos do processo de individuação, é ativado na psique. De modo semelhante, num certo período da vida de uma lagarta sua pele externa se endurece e, dentro daquilo que se tornou um casulo, ocorre um processo de total desintegração orgânica, até que o casulo seja apenas uma pele dura recheada de uma substância gelatinosa. Mas, a partir dessa gelatina evidentemente rudimentar, a borboleta logo formará asas gloriosas.
Esta é a história simbólica da alma, conhecida por milênios de tentativas humanas em direção ao estado espiritual. A lagarta poderia muito bem dizer: "Oh, destino cruel! Saturno está em conjunção com meu Sol, e veja como minha pele macia se endurece!". E pouco depois poderia gritar em completa angústia: "Me ajudem! Meu Sol progredido está•chegando a Netuno, e, vejam, tudo em mim está se dissolvendo numa gelatina!" E verdade que Saturno e Netuno seriam "figuras de linguagem" adequadas, símbolos válidos do que está acontecendo. Símbolos químicos poderiam ser igualmente eficazes para descrever esta ocorrência, ou uma sequência sinfônica em que a estrutura tonal normal cederia lugar a uma evolução atonal e dissonante. Todos são símbolos — símbolos do ritmo do processo vital que traz períodos de transformação calculáveis tanto para galáxias quanto para lagartas ou para psiques humanas. Progressões ou direções astrológicas são meios simbólicos de calcular o momento da ocorrência e a duração desses períodos, e como tais são extremamente válidas para o homem que deseja viver em termos de significado consciente. Elas não têm qualquer valor intrínseco ou espiritual para qualquer outro propósito. Nada devemos fazer com elas ou a seu respeito, exceto entender e ter mais consciência. Tudo mais é ilusão.
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Extraído do livro Astrologia da Personalidade, de Dane Rudhyar.
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