segunda-feira, 4 de julho de 2016

A Fórmula da Transformação Cíclica, por Dane Rudhyar




A fórmula cíclica que se segue, evidentemente, é apenas o mais simples tipo de estrutura, que precisa ser suplementada a cada caso particular por uma muito mais complexa, mas é paralela à fórmula igualmente simples do yang-yin da China, e afirmamos que ela tem a mesma validade universal. Seu valor está em nos dar uma nova perspectiva sobre fatores psicológicos (conscientes e inconscientes) e nos permitir interpretar todos os processos vitais no nível psicomental.

Iniciamos o ciclo com o indivíduo, isto é, com uma entidade única na qual está integrado certo número de elementos coletivos. Desse indivíduo emanam, através de uma operação que estudaremos aqui, novos elementos, que são a exteriorização de seu ser individual.

Esses elementos, uma vez liberados pelo indivíduo, tornam-se elementos coletivos. Eles se registram nas mentes de outros indivíduos, que podem ou não assimilá-los; tornam-se propriedade comum de toda a humanidade. Tais elementos coletivos, emanados por indivíduos, são todos acrescentados ao depósito de experiência coletiva e conhecimento coletivo. Eles acumulam e constituem uma memória racial, da qual emerge uma cultura, ou, em geral, uma civilização.

Civilização, em seu sentido mais elevado (e não como descrita por Spengler, que vê apenas sua sombra), realmente é um processo. E o processo de integração de elementos coletivos. Cada geração de homens empurra o processo um passo adiante, à medida que indivíduos dessa geração emanam novos elementos a partir de suas próprias identidades individuais. Civilização, como um processo, culmina com a formação do que os místicos chamaram "cidade sagrada", a "nova Jerusalém" — e, ao menos num certo sentido, a "Loja Branca". Isto quer dizer: termina na construção de uma formação ou entidade individual — no nível psicomental — que podemos chamar, como H. P. Blavatsky, de "Manu-Semente". Ela é a semente da planta psicomental da civilização.

Essa semente, como um Indivíduo psicomental e, num certo sentido, cósmico, emana, no início, de elementos coletivos de um novo ciclo. Esses elementos coletivos constituem as "imagens primordiais do inconsciente" de que fala Jung. São também a "revelação primeva" da teosofia e a "soma total de ideias inatas" de outros sistemas filosóficos. Estas, combinadas com uma nova terra, ou, em termos genéricos, novos materiais substanciais, constituem por sua vez as estruturas arquetípicas ("as entidades astrais") de um novo tipo racial. A partir da matriz, que esse novo tipo racial constitui, emergirão indivíduos pelo processo de evolução ou individuação. E o ciclo recomeça.

A fase do processo cíclico durante a qual o indivíduo emana elementos que se tornam a "matéria" psicomental coletiva da civilização é a de coletivização. A fase durante a qual essa "matéria" se integra no "Manu-Semente" ou "cidade sagrada" é a fase de individuação. Reproduz numa escala maior o processo segundo o qual um homem isolado integra todas as energias psicomentais de seu ser e se torna "individuado", no sentido junguiano do termo. Um processo semelhante é o que a ciência moderna chama evolução — da ameba ao homem, mas em vez de tal processo ser uma linha reta em progressão, é cíclico.

O que pode confundir o leitor é o desenvolvimento simultâneo do homem como uma espécie e de uma multidão de homens como personalidades relativamente individuadas. Por isso precisamos distinguir entre homem genérico e homem pessoal, entre o "indivíduo menor" e o "Indivíduo Maior". Homem genérico é a imagem emanada (ou "sombra") do "Manu-Semente" do ciclo cósmico precedente, e este "Manu-Semente" representa o "Indivíduo Maior", que é um "Todo emergente" feito da quintessência de "indivíduos menores" — ou seja, personalidades humanas. Este "Indivíduo Maior" do final do ciclo manifesta-se como o "Criador" do começo do ciclo. Ele "cria" uma nova espécie: sua própria imagem. Assim "Deus" criou o homem à sua própria imagem, mas "Deus" é a soma total individuada de todos os elementos psicomentais coletivos emanados dos indivíduos do ciclo precedente. De indivíduos atuais estão emanando "ideias" e "energias" que, uma vez individuadas, em algum tempo distante, na síntese final de todas as civilizações humanas, serão o "Deus" que irá "criar" alguma nova espécie de "homens" no começo do futuro ciclo cósmico na Terra (ou talvez em outro lugar).

No entanto não devemos esquecer que o homem genérico, sendo portanto a criação ou emanação do "Indivíduo Maior", originalmente é uma massa de elementos coletivos. O homem genérico não é um indivíduo, mas a matriz da qual o indivíduo surgirá após um longo processo de individuação. Talvez ainda mais importante: precisamos saber que esse processo ocorre primeiro no nível fisiológico e depois no nível psicomental. Assim as antigas mitologias falam de várias "criações"; assim A doutrina secreta menciona primeiro a projeção de "sombras astrais" (isto é, formas arquetípicas) de seres humanos, depois "fagulhas de mente" — os núcleos em que germina e se desenvolve o ser psicomental do homem. Num certo sentido, os dois são um, mas operam em níveis diferentes de ser e organizando um tipo diferente de "substância".

Sem entrar na discussão de pontos difíceis da cosmogonia "oculta", podemos dizer no entanto que nenhuma criação nasce ou emana do seu criador como um indivíduo — nasce apenas com uma potencialidade (mais ou menos compulsiva) de identidade individual. Assim, precisamos diferenciar em cada homem entre o self racial e o self individual (potencial ou realizado). O primeiro é coletivo em sua natureza, o último, individual. Em outras palavras, o tipo genérico de homem (honro sapiens) atinge primeiro um certo ponto de cristalização, que é individuação genérica, e então começa o processo de integração pessoal a partir desse fundamento genérico.

A individuação genérica é um processo que afeta a soma total de seres humanos que pertencem a um grupo mais ou menos bem determinado. Opera pela reunião, num ambiente geográfico definido, de seres humanos que foram projetados (como "emigrantes") de vários grupos relativamente individuados e se tornaram assim, à luz da raça, "elementos coletivos". Estes elementos coletivos de várias classes são lentamente homogeneizados. O que os homogeneíza num tipo genérico (ou, mais tarde, na "cultura") é uma série de experiências comuns e a assimilação comum de certas ideias e "criações" emanadas de indivíduos criativos do grupo. E com o termo indivíduos criativos não queremos apenas dizer "artistas criativos". Qualquer um que tenha uma nova ideia e descobre um novo significado em qualquer experiência, ou que correlaciona certos fatos da experiência de modo novo, especialmente de modo simbólico — é um criador. Como aquilo que ele assim criou é assimilado por vários homens de seu grupo, dá-se um novo passo em direção à integração grupal ou individuação genérica.

Nossos corpos foram construídos e seus tipos e funções determinados exatamente desse modo — mas através de milhões de anos de individuação genérica. A herança comum da humanidade se acumulou por milhares de milênios. Essa herança comum é o "inconsciente coletivo" formulado por Jung. Ele tem um poder estruturador tremendo. E suas estruturas determinam o tipo genérico — tanto de nossos corpos como de nossas psiques. Mas não nos esqueçamos: essas estruturas do inconsciente coletivo não são apenas o resultado da assimilação das criações dos "indivíduos menores" (como definido acima); também estão ligadas causalmente àquelas "imagens primordiais" ou "ideias inatas" que, no início do ciclo de nossa presente humanidade, emanaram do "Indivíduo Maior", o "Manu-Semente" do ciclo precedente.

Repetindo, o que torna as coisas um tanto complexas é que individuação e coletivização operam em vários níveis e se harmonizam. Mas, se entendermos a fórmula que se segue, um fio de Ariadne poderá nos levar em segurança pelo labirinto do processo vital cíclico: este processo vital é de coletivo para coletivo através do individual. Mas também poderíamos dizer: de qualquer nível de individuação ao nível superior seguinte através do criativo. A primeira formulação é à luz da substância; a segunda, a partir do espírito, ou unidade.

Se tomamos a formulação de acordo com o espírito, temos a fórmula mencionada no início deste capítulo: começo-meio-fim, ou Deus-do-começo — o processo vital dualista — Deus-do-fim, ou semente-planta-semente, ou mônada-personalidade-self, em termos psicológicos. Usando o simbolismo alfa e ômega, poderíamos simbolizar a fórmula pela palavra amo, que em latim significa "eu amo". Compará-la ao Amen latino, ao Aum sânscrito e ao Omi chinês poderá ser interessante para o estudante de simbolismo. De acordo com nosso presente alfabeto, a formação simbólica deveria ser Amz. M representa o coletivo — que obviamente é análogo ao elemento-mãe ma e ao mar (mar em latim), A e Z representam os dois estágios da Semente ou do Indivíduo, o inicial e o culminante ou sintético. Segundo a psicologia, A representa a mônada; M, a personalidade (em nosso sentido do termo, equivalente ao manas sânscrito); Z, representa aquilo que, como Jung, chamamos Self (si-mesmo) (em sânscrito Sva, sendo S o equivalente sânscrito para Z, uma raiz encontrada com pequenas diferenças em praticamente todas as línguas indo-européias).

Se, no entanto, aceitamos a fórmula: de coletivo para coletivo através do individual, colocamos em primeiro lugar o processo mundial de mudança, o vasto mar de elementos cósmicos, formando todos mais ou menos individuais, que por sua vez se decompõem em partes. Então o indivíduo é apenas uma inflorescência momentânea de um processo, a crista das ondas de um oceano em permanente movimento.

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Extraído do livro Astrologia da Personalidade, de Dane Rudhyar.

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