domingo, 30 de abril de 2017

Sobre o livre-arbítrio, por Marcos Monteiro

(...) O terceiro risco é negar o livre-arbítrio. A ênfase não é no poder do astro, é na falta de capacidade da pessoa de resistir. O interessante é que, embora negar o livre-arbítrio seja um pecado grave (porque aí a salvação e a condenação não seriam frutos das nossas ações, mas do destino inescapável), negar o livre-arbítrio por causa da astrologia é, antes disso, burrice grave. Se, como vimos antes, os astros não têm influência nenhuma (são apenas símbolos), a discussão não cabe aqui. Se não há livre-arbítrio, a culpa não é do céu; eles são, no máximo, escravos junto conosco.

Este erro (que eu chamo de antropológico) merece uma explicação um pouco maior. Algumas coisas mostradas pelo céu são, sim, irreversíveis (o astrólogo pode errar, mas, se não houver erro de interpretação, a coisa mostrada vai acontecer). Isso não acontece porque os astros determinaram, mas porque a natureza da realidade é assim. Se a previsão for de um terremoto, ou de um temporal, não há muito o que se possa fazer para impedir o evento.

Outras coisas podem ser revertidas, mas com muita dificuldade. Previsões de morte de pessoas ou animais doentes; derrota em eleições, ações em tribunais, resultados de jogos de futebol. Estamos lidando com coisas que admitem intervenção, mas limitada.

Por último, algumas podem ser evitadas, até com facilidade, mas não são. O exemplo mais comum são previsões amorosas. O ser humano tem o livre-arbítrio que, por definição, pode ser abandonado. Ele sempre envolve a frustração de um desejo: escolher entre carne e peixe pelo sabor não é usar o livre-arbítrio, mas consultar o estômago. Esses desejos podem (por serem disposições psicológicas, influenciáveis pelo exterior, por mudanças biológicas) ser identificados pela astrologia e mostrar um desfecho provável que, em grande parte das vezes, é o que acontece, mesmo quando a pessoa consulta um astrólogo e é avisada dos detalhes da situação.

Uma característica importante do ser humano é que ele tem livre-arbítrio, mas que não o usa com freqüência. Uma característica importante da astrologia é que ela pode descrever o estado de coisas, inclusive as disposições internas da pessoa; e que este estado vai se comportar de forma previsível, de acordo com a sua natureza, se a pessoa não resolver ativamente resistir.

Marcos Monteiro, in Introdução à Astrologia Ocidental, Edição do Autor, 2013, pp. 27-8.

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