sábado, 29 de julho de 2017

A Recepção - Uma dinâmica útil, por Steven Birchfield

A recepção é uma importante circunstância que ocorre entre Planetas. Mas a recepção é um tema muito discutido entre os astrólogos modernos. Eu acredito que não é devido a contradições, mas mais exactamente devido a um conflito de termos e aplicações.

Como forma de evitar algum conflito eu vou citar Abu Ma’shar. E isto porque todos os outros astrólogos citam as suas definições nos seus trabalhos. Se eu começasse a citar todas as fontes, elas tornar-se-iam muito repetitivas e desnecessárias.

Eu devo também enfatizar, que é precisamente todas as ‘circunstâncias dos planetas’ que são provavelmente a grande diferença entre a abordagem puramente Helénica à astrologia, e a abordagem posterior dos astrólogos Árabes. Eu digo de uma forma diferente, mas não contraditória! A ‘pura’ perspectiva Grega dos planetas era bastante estática e encontrar-se-á poucas menções às consequências derivadas das aplicações dos planetas entre si. Somente a Lua era considerada quando era examinado o planeta do qual ela se separava e para o qual ela se estava a aplicar. Os astrólogos da Era Árabe eram mais fiéis à abordagem Helénica do que se julga. Mas talvez a sua maior contribuição para a ciência foi a introdução de um maior dinamismo de circunstâncias dos planetas entre si. Isto não quer dizer que eles foram ‘inovadores’, mas os seus julgamentos foram as conclusões naturais para o profundo entendimento dos princípios originais.

Os princípios originais de disposição que encontramos na tradição Grega, dizem que um planeta posicionado num signo dá a sua disposição para o regente desse signo. Os Gregos afirmavam que enquanto esse regente não “fall amiss” [estivesse inconjunto] então ele tinha a autoridade para dispositar os assuntos do seu domicílio (e qualquer planeta posicionado no seu domicílio). O termo “falling amiss” foi mais tarde de alguma maneira, talvez incorrectamente, traduzido do Grego para o Latim como “Cadente”. O que os Gregos queriam dizer era que um planeta que cai (literalmente) inconjunto no seu próprio domicílio, “fell amiss”. O que todos os astrólogos Árabes fizeram foi comentar este princípio, trazendo o princípio à sua última conclusão. Masha’allah declara isto no seu trabalho, “On Reception”. Nós podemos resumi-lo nesta citação de Masha’allah:

Assim como, com os outros sete planetas, qualquer um destes esteve conjunto para o seu associado desde o domicilio ou exaltação desse associado em [um dos] aspectos reconhecidos ou em um signo, e projeta ou dá a sua disposição, e se esse planeta com o qual está comprometido recebe a disposição, esse planeta levará à perfeição o seu assunto de acordo com o desígnio de Deus.

O que os autores Árabes fizeram com a doutrina da recepção não foi mais do que voltar a expressar a intenção original, de forma a ser aplicável às muitas facetas da astrologia! Estava inerente à astrologia Grega e foi trazida à sua conclusão ‘racional’ pelos Árabes. Na sua forma mais pura, a recepção é o compromisso da disposição dos planetas para com o seu regente, desde que esse regente não esteja inconjunto, ou por outras palavras, mantenha um aspecto com o planeta no seu domicílio. E aqui é extremamente importante perceber exatamente o que é significado pelo aspecto. Como eu escrevi numa publicação anterior, os planetas tinham aspectos porque os signos tinham aspectos. Assim um “aspecto reconhecido” era uma posição em qualquer signo, que não caísse inconjunto (ou, fall amiss) para o signo em questão.

Para uma melhor compreensão da recepção, vejamos a definição dada por Abu Ma’shar:

Recepção é quando o planeta [A] se aplica ao planeta [B] da casa do planeta ao qual ele se aplica [B] ou da sua exaltação, termo, triplicidade ou face [qualquer das dignidades de B onde A está posicionado]: então ele [B] recebe-o [A]. Ou o receptor da aplicação [B] está na casa do planeta que lhe confere a sua natureza e dignidade [A] ou em uma das suas outras dignidades, as quais foram mencionadas antes, então ele [A] recebe-o [B]. O mais forte deles é o Senhor da Casa ou da exaltação. O Senhor do termo ou <o da> triplicidade ou face são fracos, a menos que dois ou mais deles estejam conjuntos. Um deles pode receber o outro também por aspecto sem aplicação, embora a recepção por aplicação seja mais forte.

Abu Ma’shar está outra vez a reiterar a definição de Masha’allah, excepto que ele está a tornar muito claro que há graus de força específicos relacionados com a recepção.

A demonstração de recepção mais simples é como dizer que, a Lua está em Leão e está a aplicar-se a Júpiter em Touro. O planeta [A], a Lua ou o planeta que confere a sua natureza e dignidade está a aplicar-se a Júpiter [B] ou o receptor da aplicação está na exaltação da Lua. A Lua recebe Júpiter. Se a Lua estivesse a 4º de Leão e Júpiter a 14º de Touro, então não só a Lua recebia Júpiter, mas também Júpiter recebia a Lua, uma vez que ela está no seu termo e triplicidade. E uma vez que Júpiter está em seu termo ao 14º de Touro, ele não só executa a sua disposição para ela, mas confere-lhe a sua virtude.

Agora este comprometimento e recepção da disposição dos planetas é muito importante no qual um planeta que não seja necessariamente forte por si só, pode ser elevado e fortalecido pelo planeta que lhe envia a sua disposição. Bonatti escreve,

Por exemplo, Júpiter estava no 9º de Carneiro, e Marte estava no 5º do mesmo Carneiro; agora Marte está conjunto a Júpiter e Marte recebe Júpiter no seu domicílio, por conseguinte Marte confere a Júpiter a sua própria força ou disposição e natureza; e Júpiter tem nesse lugar a dignidade de triplicidade, logo Júpiter agora tem a dignidade de ambos, nomeadamente, o que Júpiter tem de acordo com a triplicidade e o que Marte lhe deu de acordo com o domicílio, a essa mistura que Marte faz com ele é chamada a recepção a que os filósofos chamam Alcobal.

Uma vez que Marte se está a aplicar a Júpiter, ele não só recebe Júpiter mas também confere virtude para Júpiter e o objectivo de Bonatti aqui é dizer que Júpiter já não tem três virtudes [sistema de pontuação] de triplicidade, mas agora tem oito, com as cinco virtudes de Marte por domicílio. Rapidamente se pode ver a utilidade da recepção. No meu exemplo, se a Lua estivesse a 4º de Caranguejo e Mercúrio estivesse a 14º de Touro, a Lua estaria a aplicar-se a Mercúrio e a receber Mercúrio. Contudo, Mercúrio está peregrino mas a Lua está em domicílio e triplicidade e confere a Mercúrio a sua virtude porque Mercúrio também lhe confere a sua disposição. Assim ele beneficia disto e agora tem esta virtude que ela lhe concede, que o eleva da sua peregrinação.

Tendo em mente o acima referido, podemos olhar de perto a definição de recepção de Lilly.

Recepção é quando dois planetas que são significadores em qualquer questão ou assunto estão na dignidade um do outro; como o Sol em Carneiro, e Marte em Leão; aqui a recepção destes dois planetas dá-se por casas; e certamente esta é a mais forte e a melhor de todas as recepções. Pode ser por triplicidade, termo ou face, ou qualquer dignidade essencial; como Vénus em Carneiro e Sol em Touro; aqui a recepção dá-se por triplicidade, se a questão ou a natividade for diurna; então Vénus a 24º de Carneiro e Marte a 16º de Gémeos; aqui a recepção dá-se por termo, estando Marte nos termos de Vénus e ela nos termos dele.

O uso disto é muito útil; muitas vezes quando a resolução do assunto é negado pelos aspectos, ou quando os significadores não se aspectam, ou quando parece muito duvidoso o que é prometido por quadratura ou oposição dos significadores, apesar disso se ocorrer uma recepção mútua entre os principais significadores, o assunto é levado à perfeição, e isto sem grande problema e rapidamente, para o contentamento de ambas as partes.

Segundo a instrução de Lilly, “Aqui há recepção destes dois planetas por casas e certamente esta é a mais forte e a melhor das recepções”, convém esclarecer que esta não é a única forma de recepção, mas é a recepção que tem o maior grau de força, levando à perfeição da coisa inquirida sem obstáculos. Mas convém esclarecer também que não é exclusivamente a única recepção que funciona para levar um assunto à perfeição. Ele não diz a única recepção, mas é a mais forte e a melhor. Tenho a certeza que o interesse de Lilly era transmitir essa forma de recepção aos seus estudantes, a qual sempre deveriam efectuar. Dos exemplos de recepção de horária dados por Bonatti e Masha’allah, é claro que a recepção mútua não é a única recepção que leva à perfeição. Uma simples recepção onde o receptor também confere virtude funciona bastante bem.

Na sua forma mais fraca, a recepção é como Abu declara, quando um planeta recebe outro “sem aplicação”. Quer dizer, se no meu exemplo acima a lua estiver no 3º de Leão e Júpiter no 25º de Touro, a Lua ainda recebe Júpiter, sem aplicação, mas é fraca.

A questão apresentou-se várias vezes na lista, podem dois planetas receberem-se um ao outro não havendo aspecto entre eles. Por exemplo, Marte em Touro e Vénus em Carneiro. A resposta creio eu é sim e não. No coração da recepção está o princípio que os signos devem estar em aspecto. Houve contudo situações e condições que permitiram aos signos ter um relacionamento que não o aspecto, apesar de estarem inconjuntos. Se Marte estiver em Peixes e Vénus em Carneiro, então eu acredito fortemente que ocorra uma recepção, porque Carneiro e Peixes têm uma relação que não aspectual, isto é, são signos de igual ascensão e poder. Se Mercúrio estiver em Caranguejo e a Lua em Gémeos o mesmo acontece porque Gémeos e Caranguejo são signos de poder igual (Antiscia). Se Marte estiver a 8º de Virgem (a triplicidade e termo de Vénus) e Vénus estiver a 8º de Carneiro então a recepção acontece porque embora Virgem e Carneiro não tenham nenhum aspecto reconhecido eles são signos de igual poder (Antiscia). Al Biruni argumenta de forma convincente as condições que aliviam a inconjunção e a sua utilidade.

A este tipo de recepção foi chamado “generosidade” e Ibn Ezra explica isto à sua maneira,

Generosidade é quando dois planetas estão no domicílio um do outro, ou exaltação ou outro tipo de regência; mesmo que não estejam em conjunção ou aspecto um ao outro, ainda existe recepção entre eles.

Abu Ma’shar na sua Grande Introdução, de facto entra em maiores pormenores.

Em generosidade (i.e. recepção) alguns são considerados mais fortes, alguns mais fracos, alguns de fortaleza média. A grande generosidade está entre o Sol e a Lua. Por, a Lua a receber do Sol em qualquer signo, excepto quando em oposição, na qual está debilitada. Assim quando a Lua entra em um signo em que o Sol goza de alguma dignidade, os seus benefícios são a dobrar: um benefício é dado pelo signo [a dignidade do Sol] o outro da natureza [a natureza benéfica do Sol]. Quando outro planeta está em Virgem, Mercúrio concede-lhe dois benefícios por isso. Mas um benefício médio é o que cada estrela recebe de outra, seja da sua casa ou da sua exaltação ou da sua face ou da sua triplicidade ou do seu termo. Se duas destas são concedidas será muito bom. Seja o que for, excepto o mencionado anteriormente, será fraco.

Espero que esta informação não seja excessiva. A recepção é uma dinâmica muito útil em horária, natal, mundana e electiva. Onde as diferenças de opinião ocorrem mais frequentemente é habitualmente devido a diferenças de aplicação. Uma pergunta horária, geralmente lida com o imediato, comparado a toda uma vida em uma natividade. As regras de recepção são idênticas, mas é a expectativa que é muito diferente.



Tradução de Paulo Alexandre Silva.
Extraído de: http://www.astrologiamedieval.com/Recepcao.htm

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